sábado, 29 de outubro de 2016

Quando o riso supera o siso


O que não faltam nos enredos maternos são situações hilárias protagonizadas pelos nossos rebentos que não hesitam em dizer o que pensam  com base na visão de mundo por eles construída. É uma pena que muitos desses casos se perdem na linha do tempo, sendo substituídos por outros à medida que crescem e experimentam novas sensações.

Mesmo assim,  há registros que marcam e,  de vez em quando, são temas em almoço com a família ou em rodas descontraídas quando jogamos conversa fora. O sorriso inevitável ou a gargalhada quase infinita, acompanhados pelos comentários, refletem a alegria visível nos rostos. Momentos lindamente singulares!

Reconheço que sempre tive uma afeição particular pelo humor. Desde pequena, fatos comuns me levavam ao delírio das gargalhadas, principalmente quando havia restrições. Por exemplo: quando ia à igreja, achava muito sério aquele ritual todo: as pessoas levantam, sentavam, ajoelhavam, respondiam todas juntas, coordenadas por alguém à frente delas. Entretanto, eu sempre encontrava algo que distraía minha atenção, principalmente quando estava com a Vera,  minha irmã caçula. Nós duas ríamos de tudo. Por algumas vezes, o ambiente das gargalhadas foi justamente a igreja.

Na primeira vez, enquanto tentava acompanhar as orações, nossos olhos localizaram  uma pessoa que fazia diversos movimentos involuntários com a cabeça. Mal fazia ideia de que aquilo se tratava de uma Síndrome de Tourette. Não conseguimos mais prestar atenção na missa e desatamos a rir tanto que tivemos que sair do ambiente pela inconveniência das nossas atitudes. Fomos punidas  pelos nossos pais com um sermão bem mais extenso que o do padre.  

Outro dia, em minha casa, uma galinha choca escapou do ninho e saiu em disparada mundo afora. Atrás dela corríamos eu e minha irmã, e quando mais gritávamos “pega a galinha, pega a galinha”, mais ela se assustava e fugia. Atravessou a rua e entrou justamente na igreja,  atrapalhando o momento da oração. Impossível conter as risadas daqueles que estavam presentes, dessa vez, o absurdo que passei me fez (paradoxalmente) chorar de rir.

Em outra ocasião solene, já não tão criança, aos 20 anos, vestida de noiva, meio apreensiva, entrei na igreja acompanhada por meu pai,  para receber as bênçãos do matrimônio. De repente eu era a protagonista mais esperada daquele momento. Todos os convidados me acompanhavam com os olhos; no altar, o noivo, o sacerdote e os padrinhos pareciam tão ansiosos quanto eu. Uma tradicional música de fundo realçava a seriedade do evento. Todavia, ao invés das tradicionais lágrimas, minha reação foi contrária e incontrolável: muita risada...tanta,  que mal conseguia responder o “sim”.

Como mãe, lamento não conseguir relatar todos os episódios humorísticos em que meus filhos roubaram a cena, mas alguns estão ainda fresquinhos: uma vez, Danilo, aos dois anos, folheava o álbum de fotografias e encontrou uma em que estavam somente o pai e eu (grávida). Questionou o porquê dele não estar conosco naquela foto. Eu respondi que ele estava sim, porém na barriga porque ainda não tinha nascido.  Ao ouvir isso, ele ficou muito revoltado e amassou a foto dizendo que eu o havia engolido e ele não era comida. Ficou mais bravo ainda quando viu as nossas gargalhadas as quais impediam uma explicação plausível para ele.

Minha sogra, um dia, como autêntica avó coruja, pegou no colo o netinho sapeca e disse a ele que estava com muita vontade de dar um beijo naquele rostinho. Ele apontou para um chiqueiro de porcos e respondeu que um dos porquinhos queria muito ganhar um beijo da avó. A gargalhada foi geral. Para o Danilo, na sua inocência, não havia diferença alguma entre os filhotes de bicho e os de gente.
Patrícia, uma adorável palhacinha cheia de gracinhas e encenações. Até brava ela conseguia nos fazer rir. Quando pequena, ao varrer a casa, se irritava com os papeizinhos que voltavam. Travava, então,  uma discussão com a vassoura, com o vento, com os móveis, com quem chegasse perto...  Aquilo era uma comédia para mim que ria escondida para que ela não visse, senão... 

Para cada situação,  tanto favorável como desfavorável, Patrícia criava uma paródia acompanhada com coreografia e exibia seu espetáculo para quem quisesse (Na verdade, esses shows continuam ainda hoje em exibição para os amigos e familiares).

 O alvo, certa vez, foi uma vizinha da minha mãe que teve uma atitude de descaso em relação a minha filha  e o Lucas (primo e parceiro nas paródias e danças). A infeliz da mulher não queria que minha mãe levasse os netos à festa.  Como resposta, as crianças inventaram uma música ridicularizando a mulher (destacando as  bochechas dela) e o bolo (cheio de glacê).  Cantaram e dançaram isso para nós. Muito criativos e incrivelmente engraçadinhos esses dois pestinhas. Amei!!

Danilo e Patrícia, quando adolescentes, ficavam em casa sozinhos durante o dia. Estudavam pela manhã e tinham a tarde toda para inventar coisas. Eu e o pai chegávamos à noite e, de vez em quando, éramos  surpreendidos por vídeos que eles montavam com diferentes performances: imitações(principalmente do Raul Seixas), teatros de bonecos, shows, reportagens diversas, etc. Uma chuva de risos e gargalhadas inundavam esses momentos. Deliciosamente inesquecíveis!!!

Não posso afirmar que  a comédia se fez presente cem por cento em nosso lar;  por vezes, o drama  também atuou e deixou marcas que serviram como  experiências necessárias  para o amadurecimento de cada um. Contudo, a  nossa alegria e proximidade faz com que  o riso supere o siso. Dessa forma,  não abrimos mão da risada discreta nem da gargalhada gostosa e barulhenta que tornam tão leves e significativos o aprendizado para a vida!


Zizi 15/10/2016

Nenhum comentário: