sexta-feira, 25 de novembro de 2016

Joias pra lá de raras...


Meu personagem-protagonista: um menino traquina, teimoso, inquieto, aprontou muitas artes e proferiu tantas graças que fica difícil selecionar a mais relevante. Mesmo assim, tentarei  esboçar uns flashes significativos, pedacinhos de enredos  inesquecíveis:

CENA 1  (Danilo)
Folheando o álbum de fotografias, o pequeno loirinho de apenas um ano observa atentamente  todos os registros coloridos eternizados pela lente da câmera,  e uma dessas imagens, em especial, desperta a sua atenção: um local bonito com muitas plantas e alguns brinquedos. Reconhece as duas pessoas que ali estão: papai e mamãe. Isso o intriga, afinal ele não se lembra de nenhum passeio em que não estavam todos juntinhos,  os três. Decidido a sanar tal mistério, Danilo questiona o porquê de não estar junto a nós naquela foto. Encantada com a curiosidade dele, acariciei-lhe os cabelos e respondi que ele estava lá sim, mas dentro da minha barriga porque ainda não havia nascido. Essa informação só serviu para aumentar a sua revolta: “O QUÊ? EU ESTAVA DENTRO DA SUA BARRIGA??_Gritou indignado e continuou:_ ENTÃO VOCÊ ME ENGOLIU!!! POR QUE VOCÊ ME ENGOLIU? EU NÃO SOU COMIDA!!”  Disse isso com o rosto banhado pelas lágrimas, pois não se conformava “ter sido devorado” por mim e decidiu se vingar : segurou a fotografia e, com toda a força que tinha a amassou...

CENA 2   (Danilo)
Alguém chega à casa com uma correspondência e pergunta por “Maria”. Danilo é o primeiro a se manifestar, dizendo que não havia Maria naquela casa. A tal pessoa insiste e aponta para mim. Danilo discorda e afirma com convicção que meu nome é Zizi e não Maria. Nesse momento é revelado ao pequeno que eu tenho um apelido que é mais conhecido do que meu nome verdadeiro. Isso foi um choque para a criança que não se conformava com tal informação. Chorou muito e justificou, segundo ele,  “MARIA ERA NOME DE EMPREGADA DOMÉSTICA E MINHA MÃE NÃO É ISSO”. Mais uma vez o menino derramou lágrimas de desapontamento,  porque somente aos quatro anos descobriu o verdadeiro nome da mãe.

CENA 3  (Patrícia)
Patrícia é espontânea demais  e pouco dada a filtrar seu discurso. Sua inocência misturada ao excesso de franqueza já rendeu  algumas pérolas que me deixaram embaraçada e atônita. Destaco, dentre elas, duas situações em que a pequena foi além da conta:

Um dia, no prezinho, os alunos estavam sendo filmados durante a aula realizando algumas atividades para integrar à edição do vídeo de formatura deles. Quando percebiam a câmera se aproximando, as reações eram distintas:  alguns sorriam felizes, outros pareciam envergonhados, uns disfarçavam e procuravam agir como se nada estivesse acontecendo. Em meio àquela agitação toda,  uma menina olhava insistentemente  para a câmera,  procurando mostrar o seu desenho. Quando o grupo da filmagem se aproximou da sua mesa,  a pequena não perdeu tempo: Sorrindo, expôs a obra-prima e em seguida, mostrou o dedo do meio para a câmera,  sem qualquer maldade ou noção do significado pejorativo daquele gesto. Se alguém tivesse me contado que a Patrícia fizera um gesto obsceno aos 6 anos de idade,  eu não acreditaria, entretanto a prova está naquela fita de vídeo em VHS...

CENA 4 (Patrícia)
No ano seguinte, a princesa iniciou sua vida escolar no Ensino Fundamental 1 na escola onde eu era  escriturária. Entre algumas pessoas que trabalhavam lá comigo, havia um homem de poucas palavras, sisudo e meio mal humorado que mantinha uma imensa barba há anos. Um belo dia, no horário do intervalo,  a terrível da minha filha dirigiu-se à secretaria da escola para me dar um “oi” e pedir dinheiro para um lanche. Viu a tal pessoa e proferiu-lhe algumas observações: “CREDO, QUE BARBA GRANDE E FEIA! APOSTO QUE QUANDO VAI COMER MACARRONADA, SUJA TODA ESSA BARBA COM MOLHO DE TOMATE! POR QUE VOCÊ NÃO CORTA ESSA BARBA?”
Imediatamente eu a dispensei  e, embaraçada pelo vexame,  pedi desculpas ao homem. O incrível nessa história é que no dia seguinte ele apareceu com a barba feita (graças aos indiscretos comentários da minha Pequena Notável. Só pode!).                
                                                                            [...}
As crianças são excelentes fontes de situações hilárias que marcam uma época. Os anos passam,  e enquanto nossa memória estiver com as engrenagens funcionando corretamente, tecemos  reminiscências aprazíveis, cheias de humor e regadas com o elemento surpresa,  pois estas fontes constituem o nosso néctar lexical.

Embora os filhos carreguem traços físicos e psicológicos dos pais, eles possuem identidade própria, são únicos, singulares, perfeitos na sua imperfeição. Suas pérolas não são frutos de indisciplina, são apenas descobertas genuínas de quem inicia sua peregrinação rumo à constante evolução do ser...


Zizi, 25/11/2016

sábado, 19 de novembro de 2016

O azul e o rosa compondo a corte


Alguém à caminho desencadeia uma série de alterações na nossa rotina . Não importa se é ele ou  ela ,  é um novo ser que está em processo de formação e que, em pouco tempo, ocupará um cantinho no berço, na cama, na mesa, nas dependências da casa e no quintal;  repousará nos braços; preencherá, com seus sussurros, risos ou choros, os vazios que intermeiam as paredes; será o centro das atenções;  o tema em (quase)todas as conversas, o assunto predileto; o multiplicador de alegrias;   o principal ingrediente de um amor tão intenso e infinito que já se manifesta antes de sua chegada a esse mundo. Nem faz ideia de como essa vida é esperada!

Um olhar retroativo pela linha do tempo (1984 e 1986) buscam episódios para compor mais um relato significativo:

 Uns meses apenas me restavam para que fosse providenciado o enxoval e os demais itens utilizados no dia-a-dia de um recém-nascido. Levei em conta as experiências alheias para formar a minha. Dessa forma, segui as orientações das mestras: minha mãe e minha sogra e as dicas das minhas irmãs, mamães duas vezes antes da chegada do meu primeiro rebento.

Nos anos 80 não era costume solicitar o ultrassom para saber qual o sexo do bebê. A surpresa ocorria no momento do parto. Até lá, as apostas, adivinhações, simpatias reinavam entre os amigos e a família.

Durante  a fase da gravidez, o arco-íris das roupinhas ia se compondo pelos tons mais gerais: branco, bege,  amarelo e verde. O azul e/ou o rosa ficaram para depois do nascimento por questões de preferência. As dezenas de fraldas branquinhas, compradas por quilo, tiveram suas barras feitas à máquina de costura e depois lavadas, passadas, dobradas e guardadas com muito carinho. Por sugestão de quem entendia mais que eu, providenciei uns cueiros para envolver o futuro bebê e mantê-lo mais aquecido. Isso não substituiria, lógico, os cobertores macios e quentinhos nem as mantas com detalhes rendados.

Embora nossa renda mensal não permitisse um enxoval mais sofisticado, adquirimos o necessário  com  a vantagem ainda  de poder contar com o apoio da família e de amigos generosos que contribuíram com presentes variados, entre eles o berço e o carrinho cujos preços sempre assustam. Outro detalhe diferenciado e motivador: naquela época as mamães ganhavam, no último mês de gravidez, um valor correspondente a meio salário mínimo para ajudar nas despesas. Aproveitei a cortesia e, junto às minhas economias,  investi em: fraldas de tecido, calças plásticas,  roupinhas diversas, toalhas, meias, babadores, luvinhas, faixas (para o umbigo), lençóis para o berço, fronhas, cobertor, mosquiteiro, manta, mamadeiras, chuquinhas, chupetas, banheira,  alguns produtos de higiene e o básico de primeiros socorros...

Não fiz chá de bebê, mas os presentes chegaram logo após o nascimento de cada um dos meus filhos. Muitas visitas trouxeram, além do carinho e felicitações pela vinda do novo ser,  brindes variados. Um deles inesquecível: dois macacãozinhos: um azul e um rosa, pois os tios do Marcos pensavam que eu havia dado luz a um casal de gêmeos. Usei no príncipe (Danilo) a linda roupinha azul e guardei a rosa por quase dois anos até que, finalmente, a princesa (Patrícia) veio compor a nossa corte.

O primeiro filho leva, em partes, algumas vantagens: inaugura tudo: móveis, roupas e todos os  acessórios de bebê; o segundo reutiliza alguns desses utensílios quando convém, porém não abre mão de mostrar sua particularidade em novas roupas e novos adicionais que melhor o caracterizem, sobretudo as meninas que costumam ser mais contempladas com apetrechos peculiares oferecidos no comércio.


Referentes ao enxoval, mudanças ocorreram de lá para cá : as  fraldas de pano passaram à descartáveis (que prático!) inventaram paninhos de cheiros (que fofo!), os cueiros e as faixas de umbigo sumiram( e não deixaram endereço, que bom!) não se enrolam mais bebês como pacotinhos (pra quê?) e os pais não têm ajuda do governo para comprar o enxoval (isso sim faz falta!). Entretanto, isso não interfere no clima intenso de expectativas e alegrias de quando estamos à espera da chegada do nosso maior milagre: o da VIDA!!  

 Zizi, 19/11/16

Entre reclamações ou elogios, prefiro ambos!


As traquinagens dos pequeninos já renderam páginas e páginas de relatos. Eu ficava imaginando como esses dois  se portariam na escola quando chegasse o momento. Confesso que mil preocupações surgiam e faziam pouso em minha cabeça. Afinal,  meus dois docinhos eram ligados no 220, principalmente o Danilo.

Como eu parei de trabalhar para cuidar deles quando pequenos, não tinha pressa de mandá-los à escola. Pelo menos pensava assim no começo. Se dependesse dos meus planos, eles iriam somente aos 6 anos. Entretanto, as pessoas comentavam sobre a necessidade de as crianças frequentarem a escolinha para a socialização e preparo da futura vida escolar. Acabei concordando e providenciei o uniforme vermelho e os materiais para o loirinho peralta quando ele completou 04 anos. Ele até gostou, porque, embora tivesse que realizar algumas atividades, brincava bastante e se distraía com os novos amiguinhos. Nesse primeiro momento correu tudo bem e não havia nenhuma reclamação dele. Pelos vistos, o meu garoto era arteiro só em casa.

Nesta escola ele ficou até completar a idade para ingressar no Pré 3, que representava uma antecipação para o primeiro ano. Deu início, assim,  ao Ensino Fundamental 1 e 2 e, depois, ao Ensino Médio. Quando  pensei que estava tudo sob controle, eu fui chamada à escola porque ele havia levado de casa, sem permissão, um cadeado pequeno e durante o intervalo, correu atrás das crianças querendo prender o objeto na orelha de qualquer uma delas. Foi um alvoroço! Enquanto as crianças gritavam desesperadas, ele se divertia e corria mais ainda.

No Ensino Fundamental, certa vez, a professora pediu para as crianças contarem algum fato importante ocorrido em casa e o Danilo fez uma redação descrevendo um dia em que o pai, cansado de ver tantos brinquedos espalhados pela casa, disse que pisaria em todos eles e os quebraria se eles não os recolhessem e guardasse no local certo. Ele descreveu isso de uma forma tão dramática que a professora  ficou impressionada e nos chamou para mostrar a redação dele e pedir esclarecimentos sobre o provável nível de violência daquela cena. De certa forma fomos considerados pais “carrascos”, lógico que injustamente, pois o pai apenas tinha feito uma dramatização, um teatro e a criança não tinha maturidade para perceber isso.

Outra vez, fui parar na escola por conta do desentendimento do Danilo com alguns colegas, os quais  montaram um grupo para dar uma surra nele. Eu estava a caminho do trabalho e tive um mau pressentimento em relação a isso. Segui meus instintos e desci do ônibus, como se soubesse o que iria acontecer. Foi dito e feito. Eles esperavam lá fora para atacá-lo no horário da saída. Cheguei a tempo, fui conversar sério com eles e evitei o pior. O que um bom discurso de mãe não consegue?

A Patrícia, por sua vez,  não quis saber se tinha ou não idade para ir à escola. Quando percebeu que o irmão tinha aquele compromisso escolar diário e trajava um uniforme com uma cor que ela adorava, pediu, encarecidamente, para ser levada à escola também. Entretanto a pequena só tinha dois aninhos, era muito cedo para iniciar os estudos. Todos os dias, ela chorava inconsolada,  pedi, exigia e fazia campanha para ir à escola. Consegui segurar durante um tempo, mas depois decidi ceder aos apelos da princesa (Afinal, é tão raro uma  criança derramar tantas lágrimas por querer ir à escola! Deixe que sacie sua sede do saber...).

Patrícia, uma criança que se sentia adulta, ficou felicíssima e fez por merecer. Embora não abrisse mão dos brinquedos e brincadeiras, AMAVA estudar e manteve essa postura durante a pré-escola, o Ensino Fundamental, o Ensino Médio e o Superior. Aluna nota DEZ ,  com um senso crítico aguçado, sempre atenta às explicações,  não se calava quando ouvia alguma informação distorcida ou falsa, era, portanto,  o terror dos professores despreparados.

Um dia, em uma aula de literatura, a professora explicou sobre “Dom Casmurro” na sala e fez um comentário pessoal sobre Capitu. Patrícia não concordou e entrou em debate com a professora, pois conhecia todos os detalhes da obra e era apaixonada pelo romance, assim como eu.

Outra vez,  soube que ela havia amassado e jogado no lixo uma avaliação que recebera . Levou bronca, é lógico,  porque jamais eu apoiaria tal atitude! Anos depois, revelou-me que fizera aquilo porque o professor cometeu uma injustiça com ela na sala de aula e sentiu-se humilhada diante dos colegas. Sua reação foi uma consequência da falta de ética do professor.

Houve, também,  uma ocasião em que a Patrícia foi orientada pela professora a reagir agressivamente às provocações de uma coleguinha de sala. Foi a única vez, que eu saiba, que ela bateu em alguém. Mesmo assim, eu não fui comunicada, do fato porque  a professora  foi sua cúmplice. Tempos depois, soube  pela própria Patrícia. Nem fui investigar o acontecimento porque sempre acreditei na coerência das palavras da  minha filha.

Aprendi que somente em casa, os filhos são prioridade; na escola as regras mudam um pouco porque são dezenas de seres disputando o mesmo espaço e atenção e não há como garantir cem por cento da aprendizagem. Aquilo é apenas um breve preparo do terreno durante uma fase que dará sequência a outra, depois, outra;  depois... Aplausos, as cortinas se abrem, entram e, com maestria, exibem o diploma,  nossos queridos profissionais. Quanto orgulho!!


 Zizi – 11/11/2016

sábado, 5 de novembro de 2016

Dói mais em mim


O desejo de ser mãe está  vinculado às cenas doces como:  brincar com o filho, alimentá-lo, passear, correr, ensinar-lhe os primeiros passos e as primeiras palavras, acompanhá-lo à escola, lidar com as traquinagens, ajudá-lo a descobrir o mundo e tantos outros momentos únicos que permanecem em nossa memória,  pois cada uma dessas fases é singular e marcante.

Entretanto, os enredos das narrativas maternas são compostos de capítulos diversificados e, entre eles, as lágrimas ou a angústia tiveram seu papel garantido, sobretudo naqueles momentos difíceis em que temos que transformar “tripas em coração”. É nesta hora que desejamos trocar de lugar com eles para evitar que sofram (ahh, se isso fosse possível!!). Os exames são necessários, as picadas doem, mas garantem a saúde da criança; isso é óbvio e inquestionável.

Mesmo certa de tudo isso, como é difícil para uma mãe acompanhar as primeiras vacinas, as injeções, a ida ao dentista, os exames de sangue, os soros, as internações,  as possíveis cirurgias... O mundo desaba para ela. Mesmo aquelas, aparentemente fortes e corajosas,  escondem (necessariamente) um desespero misturado com insegurança, porque sabem que não tem com quem contar nessas horas e não há como fugir.

Como mãe, também experimentei tais fases as quais renderam episódios ora hilários, ora dramáticos. Conheci a maternidade na década de 80. Nessa época não se faziam os famosos testes do pezinho. As crianças nasciam, ficavam no berçário e eram levadas aos quartos das mamães para serem alimentadas, depois retornavam ao cantinho coletivo de bebês.  Só havia algum procedimento doloroso se surgissem problemas de saúde que precisavam ser tratados.

A efetiva jornada materna inicia-se em casa. O medo já começa no primeiro banho. O receio de derrubar ou machucar aquela coisinha tão frágil, meu Deus!! A madrinha do Danilo fez questão de dar o primeiro banho nele; depois, ficou por minha conta segurar, banhar e limpar aquele serzinho de 2,500 kg. Como fazia parte do pacote tais funções,  enfrentei os desafios. Na segunda vez como mãe, mais segura pela experiência que já tinha, encarei, mais confiante, a Miúda de 2,300 kg. Descobri, então, que Deus não olha só as crianças, mas as mães, para que estas possam, com garantia,  dar sequência ao ilustre ofício a elas determinado.

Mesmo assim, algumas falhas,  não pude evitar: Danilo caiu da cama quando bebê e esse foi um dos primeiros sustos. Depois, outro maior: nos primeiros meses, ele chorava muito devido às dores de barriga e eu passava o ferro quente em uma fralda e a colocava sobre sua barriguinha para amenizar as dores. Em uma dessas ocasiões, o ferro quente escorregou e caiu na perninha dele, fez uma cicatriz de queimadura. Tanto o tombo quanto a queimadura me fizeram sentir uma ÍNÚTIL e INCOMPETENTE, a pior mãe do mundo!!

A Patrícia sofreu menos nesse sentido porque já tinha uma mãe mais esperta e experiente. A única e grande preocupação na fase infantil foi seu pouco peso. Era muito magrinha, demorava em ganhar algumas gramas, e isso me preocupava demais.  Recorria a médicos desesperada e eles não davam nenhuma importância ao fato, pois, segundo eles, a menina era saudável e aquele era seu metabolismo.  

Meus filhos, quando crianças e adolescentes nunca ficaram internados,  nem tiveram nenhum osso do corpo quebrado. O vilão da história foi a Benzetacil que, infelizmente, era um dos antibióticos mais receitados naquela época. Sempre que alguém aparecia com qualquer tipo de infecção ou febre, “Benzetacil  nele”! A garganta das minhas crianças inflamava com facilidade e, sabendo qual remédio seria indicado pelo médico, eles entravam em pânico,  pois conheciam o sabor doloroso e inigualável daquela  picada cruel e insensível.

O Danilo, na hora da medicação,  fugia, driblava as atendentes, escapava dali, escorregava daqui. Precisava de uma “galera” para pegá-lo e segurá-lo. Eu passava a maior vergonha porque ele, além do papelão que fazia, ainda xingava as atendentes, gritava que elas estavam loucas, que queriam matá-lo, etc... A primeira vez que a Patrícia assistiu a cena de desespero do Danilo, ela ficou tão assustada com aquilo que ajoelhou-se ao chão e com as mãos postas, pediu “pelo amor de Deus, não matem meu irmãozinho!”.

A Patrícia, depois que foi apresentada à famosa injeção em uma crise de amidalite, também ficou em alerta. Todavia, não utilizou as estratégias escandalosas do irmão. Na sala do médico, quando ouviu  que iria tomar aquela injeção dolorida, começou a chorar e pediu ao médico que trocasse o remédio porque ela  iria sofrer muito. Falou com tanto jeitinho que comoveu o doutor. A pedido dele,  foi incluído no conteúdo da injeção uma dose de Xilocaína para anestesiar o local. Quando sentiu a diferença, ela adorou e,  desse dia em diante, toda vez que ia ao médico,  fazia a mesma solicitação e seu pedido era atendido.

Os momentos das injeções, vacinas, exames de sangue eram uma mistura desigual de humor e drama. Eu tinha que acompanhá-los e controlá-los, mas por dentro eu estava apavorada porque as agulhas (até hoje) me aterrorizam e eu não podia deixar que percebessem essa minha fraqueza. Eu simplesmente segurava-os firmemente e virava o rosto, fechando os olhos, pensando “vai acabar logo, vai acabar logo”.  Sou daquelas que morre de medo, mas encaro se precisar, só para não delegar minhas funções a outrem.

Hoje, a infância e a adolescência deles retomam a pauta por meio dos relatos ou nas fotografias e rendem muitas risadas com gostinho de saudades. Eles cresceram e superaram o medo das agulhas. Quanto a mim... Não aprendi ainda a lidar com machucados, fraturas, cirurgias ou quaisquer procedimentos similares. Dói mais em mim...


Zizi, 05/11/2016