sábado, 29 de outubro de 2016

Enredos que permitem sonhar

A  exemplo dos brinquedos, os livrinhos fazem parte do universo infantil e estão espalhados de norte a sul pelos cantos da casa por onde circulam os pequeninos. Assim, exalam seu poder encantador em ocasiões distintas: como diversão na hora do banho, calmante no momento do sono, passatempo em viagens ou passeios, distração nas horas do choro,  brinquedos que personificam os contextos mais incríveis e fantasiosos... São companheiros e parceiros que além de divertir as crianças, estimulam o gosto e o prazer pela leitura.

Esse preparo do futuro leitor começa em casa com os pais  e se estende na escola. Com o terreno já adubado pela fantasia e as sementes das letras e imagens lançadas, a ceifa certamente será farta e o imensurável legado falará por si nos anos seguintes.

Coerente a essa visão, apresentei aos meus filhos, desde os seus primeiros anos, uma diversidade de leituras.  Atentos e curiosos, eles escutavam as historinhas (ou outros gêneros textuais) que eu lia para eles.  Chegavam, às vezes, a memorizá-las. Descobri isso um dia quando fiz uma pequena pausa durante a leitura de um álbum de figurinhas e o Danilo a completou corretamente.  Fiquei surpresa e repeti a cena em outra página; descobri,  então, que ele sabia de cor todos os comentários escritos de cada imagem colada naquele álbum. Dois aninhos de idade era ser pouco para o domínio das letras, mas não para a leitura de mundo daquele curioso menininho.

Uma vez, na editora Ática, a Patrícia encantou-se de tal forma com um livro-brinquedo denominado “Casinha da Ninoca”,  que não me deu outra alternativa a não ser comprá-lo, embora tal despesa fugisse (e muito) do orçamento permitido para aquele momento. Entretanto, foi compensador ver a felicidade que essa aquisição lhe trouxe,  e observar que até hoje  ela o mantém entre os pertences que mais ama. (Patrícia, hoje adulta,  é uma leitora assídua e  além disso, sabe transmitir suas ideias em verso e prosa de forma maravilhosa). 

Gibis, livrinhos ilustrados, com formatos de brinquedos, interativos, álbuns de figurinhas... Novidades sempre surgiam e eu procurava adquiri-las para presentear os meus pequenos e, assim, dar a eles a oportunidade de vivenciar experiências inesquecíveis que a leitura permite.

Da mesma forma eu agi com os netos. Gabriel  iniciou sua carreira como leitor logo que nasceu, contando com a participação efetiva de leituras com: o papai, a mamãe, o vovô, a titia e esta vovó coruja. Ele possui um arsenal de livros infantis, gibis, enciclopédias, etc. Além das histórias tradicionais, saciamos sua sede e curiosidade com livros sobre mitologia, meio ambiente e animais(sobretudo dinossauros). Possui tantos livros que não cabem na sua estante. Sempre que íamos ao supermercado, queria um gibi. Por isso, ganhou uma assinatura por  dois anos de gibis da Turma da Mônica (infantil e adolescente) que ele ama e não se desfaz.

Gabriel, na escolinha, levava em sua mochila vários livrinhos infantis e os  lia para as crianças menores. Dessa forma, ele as deixava mais tranquilas. Elas se sentavam em torno dele e o ouviam atentamente. As professoras ficavam maravilhadas com a atitude sábia desse anjo em forma de menino.

Outro dia, em casa, Gabriel estava no sofá folheando alguns dos seus livros. Eu tinha chegado do trabalho e estava muito cansada. Sentei perto dele, deitei a cabeça em seu colo e ele, vendo minha indisposição, disse que iria ler uma historinha para mim. Nem deu tempo terminar o texto escolhido. Eu adormeci profundamente, embalada por aquela leitura proferida com tanta doçura e carinho. Dessa vez,  houve uma inversão dos papéis: foi ele que me colocou para dormir. Minha filha não perdeu tempo e registrou essa cena singular como prova do poder mágico da literatura.

O outro netinho, o Johnny, completou seu primeiro ano de vida, mas desde os primeiros meses  demonstrou que é um leitor convicto. Os livrinhos atraem sua atenção, sejam eles  ilustrados,  sonoros, escritos, interativos, de tecido, plástico ou de papel. Ele o segura com determinação, corre os olhinhos em toda a sua dimensão e faz a leitura em seu dialeto particular. É encantador! Quantas histórias aguardam ansiosas para serem, futuramente,  degustadas por ele!

Enfim, a ficção é um ingrediente fundamental para a realidade construída no decorrer dos dias e anos. As leituras marcantes que compõem esses momentos criam enredos deliciosos e inesquecíveis registrados nas lembranças, nas imagens e nos escritos que aqui estão.


Zizi, 29/10/2016

Ele corre para o mar, ela foge do mar


 Ahhh, o mar!!  Tão imenso, desafiador, poderoso, imponente, assustador, forte, mágico, complexo, fascinante, inspirador... Conhecê-lo,  é mais que uma aventura, é a concretização de uma expectativa construída a partir dos primeiros anos da  infância.  As imagens vistas nos livros, revistas, jornais ou televisão, já despertam um desejo de conhecê-lo e de caminhar na areia sentindo as pequenas ondas roçando nos pés,  e depois, entregar-se, sem resistência, ao mergulho naquela vastidão de água salgada.

Nos esboços imaginários tudo parece exato e perfeito. É como estar diante de uma receita de guloseima e não ver a hora de prepará-la,  para depois de pronta,  saborear, tranquilamente, cada bocado ou fatia,  sentindo o gostinho do infinito...

Chega, enfim, o dia em que os ensaios fantasiosos tornam-se experiências reais e memoráveis. Principalmente quando essas idas aconteceram poucas vezes. Conheci a praia e o mar na adolescência, em uma daquelas excursões de bairro que aconteciam todos os anos, especialmente no período das férias escolares.  Amei! 
Na  segunda vez,  aos 22 anos, já era casada e mãe do Danilo. Queria apresentar a esse inquietíssimo menininho loiro,  a grande água, pois até então só conhecia o precioso líquido que jorrava  da torneira, chuveiro, ou mangueira e caía em uma pequena piscina particular conhecida como banheira em sua casa. Ele precisava saber que aquilo tudo representava  uma gotinha,   se comparada à imensidão azul que desliza suavemente sobre as areias da praia.

Danilo era bebê, tinha menos de um aninho de idade, brincou e se divertiu um pouco na água e na areia,  muito bem acompanhado e monitorado por mim, pelo pai, avó, avô, tia, primas... Acho que ele até pensou em dar um perdido em nós, mas ainda não tinha dominado a arte da Fuga. Cada proeza tem seu momento. Naquele, por exemplo, a aventura se limitava a mexer na água e na areia e pular,  de mãos dadas,  com as pessoas da família. 

Alguns anos depois voltamos à praia e,  desta vez,  tínhamos mais uma bênção para cuidar: a Patrícia.  Eu sabia como seria complicado olhar duas crianças na faixa etária dos quatro aos seis anos, por isso acionei o alerta em todos da família.

Danilo, reafirmando sua boa disposição para os desafios, explorou  sua  energia o quanto pode: corria pela areia, corria para o mar, queria nadar no fundo, queria surfar (compramos uma pequena prancha para ele brincar) Haja braços, pernas, gritos para acompanhar sua adrenalina. Fugia do protetor solar, fugia de nós...teimoso elevado a mil.
Patrícia, por sua vez, teve um comportamento inverso ao do irmão. Aceitou usar a roupa de praia, posou para as fotos,  deixou passar protetor solar, mas não quis saber de mergulhar na água salgada.  Limitou-se a molhar os pés na beira da praia e quando a onda vinha,  ela corria para fora da água. Tinha medo das ondas, essa minha “peixinha” tinha pavor das águas grandes (Pelo menos não deu trabalho algum, enquanto o irmão monopolizou os olhares atentos de todos nós...)

No final deu (quase) tudo certo: o passeio foi um sucesso, todos amaram e se divertiram, na medida do possível. A inconveniência que houve foi a exposição excessiva do Danilo ao sol pelo fato de não ter deixado repassar o protetor solar.  Sua pele é bem clara e avermelhou muito, inclusive suas orelhas chegaram a inchar. Só assim,  aceitou cremes e pomadas que aliviaram o incômodo das queimaduras solares. O mal estar passou, entretanto as marcas viraram pintinhas e ficaram registradas em suas costas para sempre.

Patrícia, depois de adulta,  revelou-me o porquê do seu receio com a água do mar. Contou que ouvira da avó, alguns dias antes do passeio à praia, uma história na qual uma pessoa conhecida quase fora levada pela força das águas do mar. E complementando tal relato, a d. Geraldina fez advertências aos riscos que o mar oferece dizendo que “ o mar tinha prometido a Deus que iria afogar os melhores nadadores e o Senhor não concordando, propôs um acordo no qual as pessoas deveriam ter três chances para se salvarem. Por isso que quando alguém está se afogando, ela afunda e emerge três vezes”. Segundo a Patrícia, a avó contou isso com tanta convicção que convenceu a minha filha a, praticamente,  não se aproximar do mar. Ela entrou em pânico.  Essa “orientação” foi tão forte que até hoje  há resquícios: quando ela vai à praia, evita entrar com água além das canelas, as palavras da avó ainda sopram em seus ouvidos e causam efeito, mesmo depois de 26 anos.

Aventuras e riscos, abusos e medos, divertimentos e preocupações...  Experiências válidas dos inesquecíveis passeios no litoral que renderam: nutridos relatos, saudosas lembranças, registros em fotos,  sabor de quero mais...


Zizi, 22/10/2016

Quando o riso supera o siso


O que não faltam nos enredos maternos são situações hilárias protagonizadas pelos nossos rebentos que não hesitam em dizer o que pensam  com base na visão de mundo por eles construída. É uma pena que muitos desses casos se perdem na linha do tempo, sendo substituídos por outros à medida que crescem e experimentam novas sensações.

Mesmo assim,  há registros que marcam e,  de vez em quando, são temas em almoço com a família ou em rodas descontraídas quando jogamos conversa fora. O sorriso inevitável ou a gargalhada quase infinita, acompanhados pelos comentários, refletem a alegria visível nos rostos. Momentos lindamente singulares!

Reconheço que sempre tive uma afeição particular pelo humor. Desde pequena, fatos comuns me levavam ao delírio das gargalhadas, principalmente quando havia restrições. Por exemplo: quando ia à igreja, achava muito sério aquele ritual todo: as pessoas levantam, sentavam, ajoelhavam, respondiam todas juntas, coordenadas por alguém à frente delas. Entretanto, eu sempre encontrava algo que distraía minha atenção, principalmente quando estava com a Vera,  minha irmã caçula. Nós duas ríamos de tudo. Por algumas vezes, o ambiente das gargalhadas foi justamente a igreja.

Na primeira vez, enquanto tentava acompanhar as orações, nossos olhos localizaram  uma pessoa que fazia diversos movimentos involuntários com a cabeça. Mal fazia ideia de que aquilo se tratava de uma Síndrome de Tourette. Não conseguimos mais prestar atenção na missa e desatamos a rir tanto que tivemos que sair do ambiente pela inconveniência das nossas atitudes. Fomos punidas  pelos nossos pais com um sermão bem mais extenso que o do padre.  

Outro dia, em minha casa, uma galinha choca escapou do ninho e saiu em disparada mundo afora. Atrás dela corríamos eu e minha irmã, e quando mais gritávamos “pega a galinha, pega a galinha”, mais ela se assustava e fugia. Atravessou a rua e entrou justamente na igreja,  atrapalhando o momento da oração. Impossível conter as risadas daqueles que estavam presentes, dessa vez, o absurdo que passei me fez (paradoxalmente) chorar de rir.

Em outra ocasião solene, já não tão criança, aos 20 anos, vestida de noiva, meio apreensiva, entrei na igreja acompanhada por meu pai,  para receber as bênçãos do matrimônio. De repente eu era a protagonista mais esperada daquele momento. Todos os convidados me acompanhavam com os olhos; no altar, o noivo, o sacerdote e os padrinhos pareciam tão ansiosos quanto eu. Uma tradicional música de fundo realçava a seriedade do evento. Todavia, ao invés das tradicionais lágrimas, minha reação foi contrária e incontrolável: muita risada...tanta,  que mal conseguia responder o “sim”.

Como mãe, lamento não conseguir relatar todos os episódios humorísticos em que meus filhos roubaram a cena, mas alguns estão ainda fresquinhos: uma vez, Danilo, aos dois anos, folheava o álbum de fotografias e encontrou uma em que estavam somente o pai e eu (grávida). Questionou o porquê dele não estar conosco naquela foto. Eu respondi que ele estava sim, porém na barriga porque ainda não tinha nascido.  Ao ouvir isso, ele ficou muito revoltado e amassou a foto dizendo que eu o havia engolido e ele não era comida. Ficou mais bravo ainda quando viu as nossas gargalhadas as quais impediam uma explicação plausível para ele.

Minha sogra, um dia, como autêntica avó coruja, pegou no colo o netinho sapeca e disse a ele que estava com muita vontade de dar um beijo naquele rostinho. Ele apontou para um chiqueiro de porcos e respondeu que um dos porquinhos queria muito ganhar um beijo da avó. A gargalhada foi geral. Para o Danilo, na sua inocência, não havia diferença alguma entre os filhotes de bicho e os de gente.
Patrícia, uma adorável palhacinha cheia de gracinhas e encenações. Até brava ela conseguia nos fazer rir. Quando pequena, ao varrer a casa, se irritava com os papeizinhos que voltavam. Travava, então,  uma discussão com a vassoura, com o vento, com os móveis, com quem chegasse perto...  Aquilo era uma comédia para mim que ria escondida para que ela não visse, senão... 

Para cada situação,  tanto favorável como desfavorável, Patrícia criava uma paródia acompanhada com coreografia e exibia seu espetáculo para quem quisesse (Na verdade, esses shows continuam ainda hoje em exibição para os amigos e familiares).

 O alvo, certa vez, foi uma vizinha da minha mãe que teve uma atitude de descaso em relação a minha filha  e o Lucas (primo e parceiro nas paródias e danças). A infeliz da mulher não queria que minha mãe levasse os netos à festa.  Como resposta, as crianças inventaram uma música ridicularizando a mulher (destacando as  bochechas dela) e o bolo (cheio de glacê).  Cantaram e dançaram isso para nós. Muito criativos e incrivelmente engraçadinhos esses dois pestinhas. Amei!!

Danilo e Patrícia, quando adolescentes, ficavam em casa sozinhos durante o dia. Estudavam pela manhã e tinham a tarde toda para inventar coisas. Eu e o pai chegávamos à noite e, de vez em quando, éramos  surpreendidos por vídeos que eles montavam com diferentes performances: imitações(principalmente do Raul Seixas), teatros de bonecos, shows, reportagens diversas, etc. Uma chuva de risos e gargalhadas inundavam esses momentos. Deliciosamente inesquecíveis!!!

Não posso afirmar que  a comédia se fez presente cem por cento em nosso lar;  por vezes, o drama  também atuou e deixou marcas que serviram como  experiências necessárias  para o amadurecimento de cada um. Contudo, a  nossa alegria e proximidade faz com que  o riso supere o siso. Dessa forma,  não abrimos mão da risada discreta nem da gargalhada gostosa e barulhenta que tornam tão leves e significativos o aprendizado para a vida!


Zizi 15/10/2016

A escolhas são deles


Interessante o caminho que o ser traça para conseguir a tão sonhada liberdade e de que forma isso se processa. A aparente fragilidade e dependência dos bebês nos permite tomar frente a tudo: brinquedos,  comida, bebida, roupas, calçados, modo de pentear os cabelos, acessórios, lugares para ir, amigos, programas de TV, leituras, comportamentos, etc.  

Um dia, porém,  ele começa a dizer “não” aos nossos gostos e decisões,   alterando, gradativamente, o enredo  de 3ª  à  1ª pessoa.  A princípio, nosso equilíbrio vai ao chão porque nem sempre concordamos com o que eles querem.  O  instinto materno, sempre em estado de alerta, acredita plenamente que cabe às mamães as determinações relevantes durante o processo do amadurecimento dos filhos.

Entretanto, o  suposto clima de antagonismo gerado nessa fase é positivo; embora sejamos responsáveis por eles com um domínio relativo que se expressa  por meio de conselhos, sugestões e ordens (nem sempre acatadas), a  evidência é uma só: nossos pequenos precisam crescer não só no tamanho, mas em sabedoria e pertinência para suas escolhas. Se for diferente, que tipo de pessoas formaremos,  então?

Certamente, toda mãe possui experiências hilárias a relatar sobre esse tema e eu não seria uma exceção,  principalmente por ter um casal de filhos e conhecer as variações típicas de cada gênero.  O primogênito, o rebelde Danilo, já aos dois anos demonstrou sua insatisfação por um determinado tipo de roupa: as formais. Era um drama quando precisávamos ir a algum evento que exigia um traje mais formal. Segundo ele, não usaria “roupa de crente”.  O pequeno observava o mundo ao redor e havia percebido que as pessoas religiosas iam à igreja  muito bem arrumadas, especialmente os evangélicos denominados popularmente como “crentes”. Ele, na sua inocência, já generalizava: arrancava a roupa, chorava, queria outra. Um absurdo para mim! De onde ele tirara aquele conceito estereotipado?

Em seu aniversário de dois anos,  deu muito trabalho convencê-lo a usar uma bermuda com suspensório infantil. Os anos passavam e os argumentos contrários  acompanhavam-no concomitantemente. As recusas quanto às escolhas de alguns tipos de  roupas tornaram-se incisivas. Só aprovava as informais: camisetas grandes, bermudas simples, calças moletom ou Jeans, tênis. Camisas, calças e sapatos sociais? Nem pensar!! Na formatura do Ensino Fundamental, teve que aceitar o que era ideal ao momento, mas com protestos. Na adolescência, como autêntico roqueiro, optou pelas roupas escuras e o cabelo comprido. Essa implicância só foi alterada quando adulto,  formado em engenharia, foi obrigado a se trajar conforme as determinações da empresa. Hoje,  quando necessário e  sem nenhuma resistência,  ele desfila cheio de pose com seu terno.

A irmã também desenvolveu opiniões próprias e restrições com relação às vestimentas desde pequena. Gostava de escolher o que queria usar e de se vestir sozinha. Em ocasião de festa de aniversário, adorava abrir os presentes e os agradecia com um lindo sorriso, mas quando ela percebia que eram conjuntinhos típicos de verão com blusinhas de alça e shortinhos, ela fechava a cara na hora e dizia que não iria usar “roupas de galinha” (no sentido conotativo). Era extremamente discreta nas vestimentas. Adorava vestidos, saias,  bermudas “decentes”, calças, desde que não ficasse exposta ao resto do mundo. Esse gosto a acompanhou durante toda a  infância e  adolescência; somente após a maioridade, ela experimentou as alcinhas e se apaixonou, descobriu, então, que não era “um bicho de sete cabeças” e que usar algo mais confortáveis não alteraria em nada o seu caráter. Para combinar com sua personalidade intensa, marcante e dócil ao mesmo tempo, Patrícia aderiu aos tons fortes e estampas coloridas, principalmente quando participa de eventos culturais ou danças folclóricas.


Segundo ela, a cor dá mais vida e alegria; além disso, as escolhas refletem o estilo da pessoa. Eu adoro tanto o branco e preto dele quanto o colorido dela,  porque na minha tela a liberdade de escolha dos pincéis é que dá forma e sentido aos sonhos de cada um, e eu os amo igualmente na sua diversidade.    

  Zizi, 01/10/2016

Os primeiros passos de muitos que virão...

Como é linda e inesquecível a fase dos primeiros passos dos nossos filhos! Inseguros ainda, eles se apoiam em tudo que está próximo, suas perninhas meio tortas e bambas ensaiam alguns movimentos para se locomover,  porém, ainda lhe faltam a firmeza e coordenação necessária para concluir o ato com perfeição. O aprender a caminhar é um dos maiores desafios enfrentados pela criança. Quando estão de mãos dadas com os pais, a história é outra;  não há problema algum e parece muito fácil, entretanto o pequeno guerreiro precisa vencer sozinho suas próprias batalhas...

Tombos, sustos, choros, nova tentativa uma, duas, três, quatro... Nós, espectadoras de carteirinha, vibramos na torcida por cada conquista. Tantas vezes assistimos às cenas. Engraçadinhos e determinados, eles não saem do foco, instintivamente,  até conseguir os primeiros passos dos muitos que virão em seguida...

Por três vezes acompanhei esse processo em minha casa: primeiro foram os filhos; Danilo e Patrícia;  anos depois,  Gabriel, meu neto,  vivenciava a mesma experiência do pai e da tia.

Danilo, medalha de ouro em precocidade, mostrou-se ansioso para explorar o universo que o rodeava. Quando percebi seu interesse e coragem em dar os primeiros passos, apoiei a ideia. Colocava-o em pé encostado à parede para que não caísse de costas, sentava no chão à sua frente com uma distância segura e o chamava até mim, sem tocá-lo. Ele encarava o desafio e vinha, movendo-se devagarzinho. Para mim, aquilo não passava de uma brincadeira, mas para ele aqueles exercícios eram sessões de ensaios cujos resultados  eu pude conferir logo depois que ele completou 9 meses. Isso mesmo: o apressadinho andou aos nove meses de idade sem engatinhar.  Adeus sossego, o mundo que o aguardasse!! Era um toquinho andando pela casa e quintal, explorando cada centímetro da sua área de conforto.  Não satisfeito totalmente, continuava a façanha  à noite ou  madrugada. Não esqueço o dia em que acordei assustada com ruídos de passos correndo de um cômodo a outro pela casa e quando fui verificar, deparei-me com ele.

Com a melhor das intenções e sempre pensando no melhor, compramos um andador que serviu depois para a irmã. Algumas quedas aconteceram, provando que o tal objeto deixava muito a desejar com relação à segurança, mesmo assim foi útil e atendeu as fases de ambos os filhos.

Em menos de dois anos, a chegada de mais um ilustre ser agitou o nosso ninho. A maratona começara novamente. Danilo, como um autêntico irmão  mais velho, ensinou algumas traquinagens para a parceirinha Patrícia, entre elas, como sair do berço. Agora nada mais a detinha! Em seguida,  tratou logo de aprender a engatinhar; mais tarde, caminhar; e finalmente, correr... Ela andou aos dez meses de idade e aprendeu a falar cedo também (Lógico! Tinha distribuir o seu arsenal de argumentos o mais rápido possível). Utilizei o método da parede com ela e deu certo também. Pequenina e espertinha, a figurinha acompanhava o irmão e ambos  se lançavam nas aventuras deixando toda a família de plantão com o coração em pulos.

Gabriel, quando chegou (Vinte anos depois) fez a diferença e tornou-se o centro das atenções. Rodeado de cuidados e mimos, não fugiu à tradição do pai e da tia, igualmente andou logo, por volta dos dez meses de idade. Fez uso do andador algumas vezes, caiu, levantou-se e foi desbravando o seu território,  cheio de  graça e sabedoria , encantando-nos a cada dia.

Enfim, andar e falar: dois verbos que Danilo, Patrícia e Gabriel aprenderam a conjugar antes de completar um aninho. O futuro tornou-se presente como num passe de mágica. Aqueles passinhos, tão bem ensaiados; aquelas primeiras palavras balbuciadas,  evoluíram;  hoje pisam firmes e confiantes nos bons caminhos que eles mesmos constroem e suas palavras são as chaves que definem o contínuo e recíproco diálogo com a vida.       
                      
  Zizi, 24/09/2016


Ídolos e heróis legítimos

O contato com o mundo da fantasia começa bem cedo quando os pequenos são colocados diante de uma colorida e animada telinha e assistem às mais diversas  histórias movidas por seus múltiplos personagens. Os poderes que cada um deles possui,  revelam-se nos momentos das batalhas, dos desafios, dos salvamentos. Os olhinhos atentos acompanham as cenas e torcem para que a vitória esteja do lado daquele que demonstrou possuir habilidades especiais que sobressaem aos demais.

Embora os episódios sejam inéditos, os enredos se repetem porque, na verdade,  não existe uma intenção de desmitificar ou de destruir a figura de um herói. Esses personagens com sua eterna busca da superação, além de alimentar e  de motivar a imaginação das pessoas, vão além do entretenimento: o fascínio pela atuação dos super heróis contribuem para a  formação da personalidade da criança; ajudam na compreensão do mundo, apresentam  valores morais estabelecendo a distinção entre o bem e o mal, estimulam o senso crítico, ensinam responsabilidades, mostram as prováveis consequências para atitudes inadequadas e, quem sabe,  podem até revelar as iminentes façanhas dos nossos super-filhos-heróis.

Enquanto eles se espelham nos atos heroicos do mundo ficcional, traçam enredos reais em nosso cotidiano, revelando suas capacidades criativas e físicas diante de outra tela denominada olhos maternos: a minha princesa, por exemplo, não é a Mulher Maravilha, mas possui coragem de sobra para enfrentar desafios, é poderosa com as palavras no sentido da exatidão e da persuasão, discernimento e inteligência guiam suas decisões,  e um ingrediente extra a torna ainda mais especial:  uma  sensibilidade aguçada conhecida como sexto sentido completa seu perfil heroico.  

 Meu príncipe também não é o Homem-aranha, mas sobe em paredes, muros, árvores e telhados rapidinho; não é o Batman, mas cria estratégias perfeitas para driblar os adversários; não é o Super-homem, mas já voou de cima do guarda-roupa para a cama; não é o Hulk, mas aos 7 anos conseguiu quebrar uma cama de madeira maciça; não é o Flash, mas soube ser ligeiro quando  perseguido pelo trote escolar; não é o Capitão América, mas haja reflexo(ou sorte) para escapar dos tombos do fogão e sair debaixo sem um arranhão ou fraturas; não é o Thor, mas sua mãozinha pesada era como um martelo que  reduzia a cacos alguns vidros e o box de banheiro, além dos brinquedos, móveis, louças; não é o Homem Invisível, mas conseguia escapar aos olhos da mãe, pai, avós e tia em lugares públicos, não é o He-man, mas sua infinita força se expressa na coragem,  determinação e compromisso com os objetivos,  além da dedicação e do amor incondicional pelas pessoas que compõem o seu coração. 

Filhos, nossos legítimos ídolos e/ou heróis.  Por eles qualquer sacrifício é aceito, sem hesitação, como um desafio pertinente.  Por eles valem as noites sem dormir, as olheiras, as dores passadas, o cansaço, as lágrimas, a correria, os nervosismos, as preocupações,  porque sabemos que eles são, literalmente, o motivo da nossa alegria, o ingrediente que dá sentido ao amanhecer, o brilho do nosso olhar, o pretexto para o sorriso, nossos melhores troféus, as maiores vitórias, a  incrível continuação do nosso ser...


Zizi, 17/09/2016

De paleontólogo a chefe de cozinha


Tenho observado que a geração de crianças que nasceram de 2000 em diante possuem um interesse maior pelos animais gigantes, tanto os répteis quanto os voadores que habitaram o planeta antes da chegada do homem.

Gabriel, meu neto com mel, nascido em 2004,  faz parte desse grupo. Em 2007, despertou o fascínio pelos monstros quando assistiu pela primeira vez ao filme King Kong lançado em 2005. O pequeno loirinho de cabelos encaracolados quando viu o bichos gigantes que apareciam no filme, encantou-se de uma  tal maneira que quis rever e rever durante muitos dias. Comecei a procurar outros filmes e desenhos com o mesmo tema (dinossauros) para suprir sua curiosidade. E não parou por aí:  todas as reportagens que passavam na TV sobre o assunto, lá estava ele, muito atento, acompanhando e consumindo cada informação. Comprei livros diversos ilustrados , jogos, DVDs, brinquedos, maquetes,  roupas e meias com o tema.  Seu quarto parecia um vale dos dinossauros. Além disso, Levamos o Gabriel para exposições de dinossauros, parque temático...tudo o que eu encontrava falando em dinossauro, eu trazia para casa e ele fazia a festa. Aliás, o seu aniversário de 4 anos foi totalmente decorado com o tema dinossauro. E nessa época não era fácil encontrar uma decoração dessa, pois as crianças estavam acostumadas com os personagens tradicionais, como super-heróis ou Disney.

Quando questionado  sobre a provável profissão no futuro, ele afirmava com veemência que seria paleontólogo. Pudera,  tão pequeno e já sabia MUITO sobre eles:  diferenciava os herbívoros dos carnívoros, sabia o nome e as características de TODOS que conhecia. Sempre nos surpreendia com seus comentários e explicações.  Esse contexto durou anos e anos.  Para mim, já estava definido qual seria sua profissão.

Assuntos gerais relacionados ao meio ambiente sempre atraem a atenção do meu paleontólogo preferido. Ele conhece muito sobre bichos e plantas, tipos de solo. Fica preocupado com a preservação da natureza e se revolta quando vê reportagens que mostram a má atuação do homem com os recursos naturais. Eu sinto que vem dele essa tendência e amor pela terra e a criação em geral. Não posso me esquecer de mencionar que o Gabriel, tanto quanto eu, adora os felinos, sobretudo,  gatos.

Entretanto, esse prodígio de menino, com nome de anjo e coração de ouro, cresceu e não ficou limitado às questões do Meio Ambiente e Ecologia . Há uns dois anos demonstra grande interesse por gastronomia. Assiste ao programa  “MasterChef” sempre que pode, pesquisa receitas na internet, imprime e as prepara com perfeição. Eu confesso que sempre estou por perto quando ele  decide preparar algo,  porque tenho receio de que se queime ou se machuque, afinal ele só tem 12 anos atualmente e desde os 10 decidiu aprender a cozinhar. Por várias vezes, afirmou que seguirá a carreira gastronômica e quando prepara algo, dá para perceber o brilho em seu olhar. Ele ama cozinhar, principalmente as novidades.

Fico imaginando de onde vem esse interesse e prazer em preparar os alimentos e chego a conclusão de que seja uma mistura da atuação de duas pessoas muito ligadas a arte culinária: a mãe dele e esta avó coruja, pois igualmente amamos fazer bolos e quitutes e oferecer àqueles que estão por perto...

Paleontólogo, biólogo, ecologista, veterinário ou Chefe de cozinha? Muito cedo para obter uma resposta exata. Menino ainda para se definir como profissional, mas,  ao mesmo tempo, um homem com habilidades e competências diversas para atuar com excelência no campo decidido por ele quando chegar a hora. Estarei lá, se Deus permitir, para aplaudir de pé essa vitória que também é minha, é nossa...


       (Zizi Cassemiro, 11/09/2016)

o que revela uma caneta?


Disseram-me, certa vez, que quando a criança completa 1 ano de idade,  é o momento ideal para saber qual será sua futura profissão. Para isso, em frente da criança sentada, deverão ser colocados vários objetos que representam funções ou profissões. Aquilo que ela escolher para brincar naquele momento representará seu futuro como profissional.

Quem sou eu para questionar uma afirmação de cunho popular?  Tantos  exemplos  mostram que a sabedoria antiga superou fundamentos científicos com suas teorias efêmeras.  Além disso, a curiosidade sempre está presente no atento olhar das mamães. Não custa nada fazer o teste...

Movida pela ideia da previsão, rodeei os meus pequeninos com canetas, papéis, brinquedos  e objetos diversos para ver como reagiriam diante deles. As crianças, geralmente, sentem-se atraídas pelo perigo.  Que mal pode haver em um objeto fino, leve e pontiagudo?, Uma caneta escreve cartas, traçam planos, desenha, informa, relata, descreve, opina, mas também fura, cutuca, prende, machuca... 

Continuei na estaca zero, já que QUASE todas as profissões utilizam a caneta em algum momento. A primeira tentativa de preceder o futuro dos meus filhos deixou-me sem resposta definida. Porém, abriu espaço para outra dúvida: e se essa escolha fosse apenas uma pista para mostrar que eles seriam pessoas apaixonadas pela expressão verbal escrita? Só o tempo me traria essa resposta um dia. Só me restava arquivar tal experiência e botar um ponto final nessa ansiedade antes que ela me escravizasse.
Três anos depois, um fato traz à tona minha curiosidade: Danilo encontra o relógio de pulso do pai e o observa atentamente.  Fica intrigado com os movimentos dos ponteiros e com o barulhinho que ouve lá dentro. Abre, então, a caixa de ferramentas do pai, retira o martelo e o utiliza para quebrar o vidro do relógio. Quando ouvi as pancadas provindas lá do quarto, corri e me deparei com a cena. No primeiro momento, minha reação foi de surpresa e indignação e,  sem hesitar, questionei sua atitude e falei que não era certo estragar as coisas do pai. Ele respondeu-me  que fez aquilo porque queria ver como funcionava por dentro. Fiquei emocionada e sem palavras. Abracei o meu (talvez) futuro engenheiro.

As folhas dos anos mudavam de páginas de forma rápida e silenciosa...

Danilo antes de aprender a ler e escrever, gostava de desenhar e fazia isso muito bem. Seria um futuro desenhista, projetista, arquiteto, artista plástico? Também era dotado de talentos musicais: desde pequeno tinha muita habilidade em lidar com os brinquedos que reproduziam sons: pianinhos, violões, flautas; na adolescência continuava apaixonado pelos instrumentos musicais. Ganhou, então,  um violão da avó paterna e ingressou no curso para aperfeiçoamento. Depois, junto a outros amigos com gostos afins, formou um grupo de rock no qual ele era o guitarrista. Concomitante a esse gosto artístico, ele interessou-se também por artes marciais e estudou Kung Fu durante alguns anos, chegando à faixa preta. Com competências distintas:  na arte, na música e na luta marcial, ficava difícil antecipar que caminho ele seguiria para definir o seu amanhã. Mas, pelo jeito,  ele estava apenas exercitando alguns dos seus domínios,  visto que no Ensino Médio, optou pela eletrônica e seguiu uma linha paralela na faculdade: cursou engenharia elétrica e formou-se em 2010. Penso que agora o meu querido e dedicado engenheiro já deve ter descoberto como funciona o mecanismo interno de um relógio de pulso.

A Pequena Notável ou Grande Miúda, denominações que costumo definir a Patrícia, é dotada de uma sensibilidade aguçada e características peculiares que vão além do meu entendimento. Desde pequena demonstrou que era determinada e tinha personalidade marcante.  Aprendeu a falar antes de completar um ano e adorava dialogar com outras pessoas, principalmente com os idosos. Quando eu percebia que ela não estava dentro de casa, sabia exatamente onde encontrá-la:  na casa dos avós paternos conversando com eles e com uma outra senhora que morava junto (d. Cinira) ou com outros idosos que moravam vizinhos. Uma menina com ideias maduras encantam as pessoas. Tinha argumento para tudo e sabia defendê-los com  maestria impecável. Cheguei a pensar que seria uma advogada por gostar tanto de argumentar e defender o que considerava correto. Mas essa propriedade de escutar, compreender e de ajudar o outro com palavras não se limita a área do Direito, vai mais além. Um dia, quando questionada sobre sua profissão futura, ela afirmou que queria ser psicóloga.  De certa forma, isso justificava sua destreza com as palavras e a interação com as pessoas.  

Na escola, as redações continham ideias maduras e bem fundamentadas e isso causava um transtorno em sala de aula porque a professora se recusava a dar nota,  alegando que seria impossível uma criança de 8 a 10 anos possuir uma visão crítica naquele nível. Consciente de sua capacidade de expressão, minha pequena criança resolveu sozinha esse dilema: pediu que a professora selecionasse qualquer tema para uma produção textual que seria feita naquele momento e em sua frente e, assim, pode provar do que era capaz. Desafios nunca assustaram essa menina corajosa com talentos especialmente voltados para a área de humanas.

Patrícia acompanhava as minhas correções de provas ou redações dos meus alunos e, de acordo com as  respectivas notas, disfarçadamente,  ela desenhava carinhas sérias, felizes ou tristes nas folhas deles. Isso causava reações adversas em sala de aula e eu tinha que me justificar perante eles. Eu teria em casa uma futura professora?  Quem sabe...

Ela cursou Ensino Médio tradicional e, ao mesmo tempo, fez curso técnico voltado para a área de edificações. Desenvolveu, a partir daí um gosto pela arquitetura e urbanismo. Apaixonou-se, também, por projetos sociais ou associados ao meio ambiente e ecologia. Saiu de casa e foi fazer faculdade pública em outra cidade a quilômetros de distância durante cinco anos. Voltou formada a minha geógrafa. No início da carreira, chegou a lecionar durante um ano e meio, pois seu curso a habilitava tanto para a licenciatura quanto ao bacharelado. Na primeira oportunidade de exercer a segunda opção, ela não hesitou e largou as aulas para atuar como geógrafa em empresas. Foi convidada a trabalhar em outro estado (Pará) exercendo seus conhecimentos no estudo do ambiente para a construção de uma nova hidrelétrica no rio Xingu, em Altamira. Embora eu tenha ficado extremamente preocupada com essa viagem longa e a estadia durante vários meses, eu acatei a decisão dela e dei o apoio necessário. Quando terminou o trabalho lá, foi transferida para São Paulo e voltou a ficar perto de mim, o que me retomou o fôlego.

Reconheço que aquela caneta,  que fora o objeto escolhido pelos meus dois filhos, não deixou de ser uma referência às suas formações profissionais: hoje, enquanto ele assina documentos, fecha contratos  e traça projetos para serem desenvolvidos; ela esquematiza mapas, estuda as condições e possibilidades ligadas à terra e,  nas horas vagas, discorre suas ideias  em verso ou prosa através da legítima veia poética que possui naturalmente...


(Zizi Cassemiro , 10/09/2016)

A vida em cores


Tenho que admitir: a televisão é babá dos nossos filhos. Não como aquela que limpa, alimenta, cuida, leva passear e possui laços afetivos; mas a que os mantém por  minutos ou  horas cativos sob a fascinante telinha de entretenimento, permitindo assim que a mãe realize as demais tarefas domésticas. Esse é o primeiro contato deles com o universo da fantasia. Depois disso, impossível  resistir aos encantos dos enredos coloridos,  diversificados, musicados e tão cheios de graça que atendem aos anseios imaginários desde a  fase infantil, adolescente e se estende à adulta.

Os anos se encarregam de escrever uma lista imensa de desenhos animados e de filmes que conquistaram a preferência dos meus ex-pequeninos. Não que eu os tenha influenciado, ao contrário, sou meio adversa a várias produções que fazem sucesso com a garotada. Não  desenvolvi esse gosto quando criança, pois não havia televisão em minha casa até os 12 anos. Raramente assistíamos a algum filme ou programas na TV e quando isso ocorria, eram em visitas rápidas na casa do vizinho. No entanto, a presença dessa “criatura que fala” não nos fez falta.  As protagonistas éramos nós nas brincadeiras criativas, nas simulações do cotidiano. Esse legado foi significativo para a minha formação. O consumismo pregado pelos meios de comunicação chegou meio atrasado e se alojou pelos cantos da casa do jeito que pode...

O dono da pensão, entretanto, é um fruto das produções visuais e sonoras que a telinha despeja diariamente. Conhece TODOS os desenhos. Já assistiu a (QUASE) todos os filmes. Às vezes eu o testo,  perguntando como é o desfecho de tal filme e ele conta TUDO em detalhes. Não sei como cabem tantas informações televisivas naquela cabeça! Lógico que ele fez questão de transmitir esse prazer para os filhotes e netos, pois assim assiste, se diverte, comenta e revive as alegrias  junto às gerações que ajudou a construir.

De certa forma, sou grata à televisão por ocupar meus filhos com suas histórias, afinal eu tinha que me desdobrar para dar conta das demais obrigações. Como seria se fosse diferente com  as minhas duas bênçãos: o Irrequieto Danilo e a curiosa Patrícia?

O Danilo gostava de alguns super-heróis. Quando pequeno, teve sua fase de “He Man”; até precisei comprar uma espada para que ele erguesse e gritasse também “Eu tenho a força!” O poder e o protagonismo ficcional já o encantava desde pequeno e não foi diferente ao crescer. Haja vista sua dedicação plena pelos objetivos traçados e as vitórias conquistadas. Todavia, seus gostos não se limitavam à proezas super-humanas, gostava muito do “Gato Félix” e do filme “O Elo Perdido”, segundo ele. Lembro-me que em alguns episódios do Gato Félix, havia um tipo de esquimó baixinho que derrubava árvores e quaisquer obstáculos em seu caminho gritando "babum". Danilo adorava o Félix, mas tinha pavor do tal de “babum”. Esse medo do personagem durou alguns anos e confesso que, algumas vezes, eu me prevaleci disso para fazê-lo obedecer.

Lembro-me também que ele sempre foi muito ligado a filmes, vídeos, programas ou reportagens que discorriam sobre bichos. “O Mundo Animal” era assistido constantemente. Por isso ele sabia e sabe tanto sobre os animais. Quando surgia qualquer dúvida referente, eu já sabia a quem recorrer.
Danilo nunca gostou de enredos dramáticos ou melosos. Na fase adolescente e adulta, preferiu as produções sobrenaturais de suspense ou terror, como: “Anjos Rebeldes; “A Hora do Pesadelo” (com o inesquecível e apavorante  Freddy Krueger); “O Exorcista”; e outros  filmes com lobisomens, vampiros, zumbis... Desenhos? “Os Simpsons”

A minha princesa, embora possua o sangue azul, NUNCA gostou das princesas frágeis e passivas como: a Bela Adormecida,  Cinderela, Rapunzel, Branca de Neve e outras. Sempre torcia para a bruxa, que segundo ela, tinha mais personalidade e atitude. Desde pequena, Patrícia já demonstrava  seu juízo de valor sobre as pessoas, mesmo as fictícias. O amor pelos animais e gostar de saber sobre eles também era tributo da pequena. Assistia e curtia com o irmão as reportagens. 

Preferi consultá-la sobre os desenhos e filmes que mais marcaram sua infância e adolescência e eis a resposta: “Muppets Baby”; “o Fantástico Mundo de Boby”; “Doug”; “Nossa Turma”; “Pedra dos Sonhos”;  “Timão e Pumba”; “As Aventuras de Tintim”; “Ursinhos Gummy”; “101 Dálmatas”; “Ducktails”; “Ursinhos Carinhosos”; “Punk, a Levada da Breca”; “Cavalo de Fogo”; “Dênis, o Pimentinha”; “Manda Chuva”; “Castelo Ra Tim Bum”; “Contos de Fada (a série)”; “A Turma do Pateta”; “programa “Glub Glub”; programa “Mundo de Beckman”; série “Anos Incríveis”; série “Mundo da Lua”; programa “X Tudo”; desenho “Os Anjinhos”; desenho “De Volta ao Vale Encantado”; “Os Animais do Bosque dos Vinténs”; “Arrume Tudo e Pare com isso”; Chiquititas”; “Tv Cruj”...

Além desses mencionados, lembro-me que eles assistiam ao ‘Sítio do Pica-pau Amarelo, “Carrossel” e adoravam “Chaves”. Nunca se interessaram por “Xuxa” nem Angélica, muito menos Mara Maravilha (que de maravilha não tinha NADA). Na verdade, NENHUMA dessas apresentadoras infantis famosas conquistou meus filhos. Segundo eles, o que salvava o programa eram alguns desenhos. (Eu concordo em gênero, número e grau que elas são dispensáveis...)

O Gabriel, meu filho com mel, “ops”, meu neto, possui um rol de desenhos e filmes preferidos;  aliás em casa há um arsenal de filmes dele que fui comprando aos poucos e ocupam as prateleiras da estante da sala, além daqueles que ele assiste pelos canais assinados.

Gabriel  adora  desenhos cujos protagonistas são gatos, em especial: Gato Felix”(não é da época dele, mas quando lhe foi apresentado, apaixonou-se); “Garfield”; “Manda-Chuva”; “Tom e Jerry”; “Mingau” da Turma da Mônica; “O Gato de Botas”. Outros desenhos igualmente o encantam desde pequeno: “Pocoyo”; “Doki”; ”Backyardigans”, “Os Heróis da Cidade”;  Picapau”; “Naruto”;Charlie e Lola“; Tromba Trem” Scooby doo”;  Sítio do Pica-pau Amarelo”; Ben 10 “ “Pokémon”; “Hora de Aventura; “Os Simpsons”... Houve a fase dos dinossauros: Em Busca Do Vale Encantado”; “King Kong”; “Jurassic Park”; “Dinossauro”, etc. Semelhante ao pai, ama assistir reportagens sobre os animais,  meio ambiente e mitologia grega. A Medalha de ouro, porém,  vai para  todos os episódios do “Chaves”, sua paixão até hoje.

Não posso deixar de mencionar que o mais novo membro da família, outro herdeiro do Danilo,  o netíssimo JOHNNY,  desde os primeiros meses provou que  a televisão também é sua aliada e companheira nos momentos em que precisa se distrair e ficar mais tranquilo. Por enquanto, as músicas e as imagens na telinha que prendem  sua atenção são: os episódios da “Galinha Pintadinha” e do “Patati Patatá”. Pelos vistos, seguirá os passos do avô, do pai e do irmão...
Por tabela, eu acabo aderindo a algumas dessas preferências pelo simples prazer da companhia dos meus filhos, netos e marido, afinal, assistir é preciso, a aprendizagem é contínua, ficar perto deles é imensurável...

 Zizi, 03/09/2016

 


 

Errinhos que se vão


Pequeninos, frágeis e dependentes: dessa forma eles chegam até nós. Que responsabilidade em nossas mãos! Desde o momento em que demos o “Sim” à maternidade, a vida se transforma em: alegria,  amor, atenção, cuidados, dedicação, ensinamentos, preocupações. Essas coisinhas miúdas e grandiosas, magicamente, se apossam do nosso coração, regendo os pensamentos, definindo as atitudes, porque são, sem dúvida alguma, nossa prioridade sem prazo para vencimento.

O ritual se inicia e lá estamos à frente de cada fase: os cuidados com a alimentação e higiene,  os primeiros passos, a pronúncia das palavras... Os olhinhos atentos dos miúdos tentam acompanhar e muitas vezes nos imitar. O que sai?  Ao invés de palavras, ruídos guturais incompreensíveis que somente uma mãe consegue depreender. Entretanto, isso não basta. Há um mundo lá fora no aguardo do processo interativo que precisa ser pleno o suficiente para suprir as exigências comunicativas desse nosso mundo moderno, tão cheio de padrões e rótulos quadradinhos.

Tais inquietações me acompanharam nas fases em que meus pequenos começaram a produzir os primeiros textos orais, que mais pareciam uma mistura de “nhem-nhem-nhem” com ”zum-zum-zum” e “blá-blá-blá” (não necessariamente nessa ordem...). Não deixa de ser uma brincadeira divertida,  esse primeiro ensaio das palavras. Aliás, acredito que boa parte dos vocábulos nasceu das onomatopeias.

Algumas coisas marcam quando as crianças chegam nessa fase: as vogais, por exemplo,  são mais enfatizadas na pronúncia infantil: “aua” é mais fácil que água; algumas palavras são cortadas pela metade, destacando a sílaba tônica;  passarinho vira “Titi”; uma quantidade grande de água é rio. Por esse motivo, quando o Danilo gritou desesperado para a avó: “O Titi caiu no rio”, ela achou graça e não socorreu de imediato o coitado do passarinho que ele havia derrubado com gaiola e tudo dentro do tanque cheio de água. Felizmente o bichinho foi socorrido e escapou da morte, porque o Danilo conduziu a avó até a área de serviço e mostrou-lhe o que realmente havia ocorrido.

Além do relato acima, o meu sapeca protagonizou outras cenas com sua hilária linguagem, todavia,  não me lembro de tudo com detalhes (Afinal são 32 anos atrás...), mas sei que o aperfeiçoamento da pronúncia dele ocorreu naturalmente com o decorrer dos meses e anos seguintes. Foi durante esse momento transitório que recebeu como presente alguém para multiplicar as descobertas: a irmãzinha Patrícia.

Pequena e esperta, ela aprendia muito rápido tudo, pois tinha um professor de plantão que precisava urgente de uma parceira para as traquinagens. Entretanto, quanto à questão da linguagem dessa Pequena Notável, foi necessária a orientação de uma especialista (fonodióloga) para ajudá-la a distinguir algumas letras e fonemas: c/g, v/f, t/b, que ela trocava na fala e na escrita. Alguns meses de treino e exercícios específicos foram suficientes para corrigir esse detalhe linguístico. Para quem sempre fez questão de expor seus pensamentos, agora com a dicção corrigida, não economizou no discurso, queria esgotar o estoque de verbos, substantivos, adjetivos...

Meu neto Gabriel também apresentou algumas dificuldades na pronúncia de alguns fonemas: x/j, t/b. q

Quando eu ouvia essas trocas, eu o corrigia e pedia que ele repetisse com atenção. De uns tempos para cá, percebi  que ele superou tais dificuldades e sua fala  não possui mais aquele tom infantil. Além dos mimos típicos de vó, lógico, eu também considero essencial diálogo contínuo com as pessoas da casa para que os filhos, assim como os netos, participem dos assuntos, opinem e possam também aperfeiçoar a expressão oral.

Enquanto observo filhos, netos,  e contemplo essas duas gerações, vejo como os anos obedecem à toada melodiosa e incansável do “ tic-tac “do tempo,  na qual algumas lembranças se acumulam, outras se perdem e depois se escondem  em alguma parte da memória. De pequeninos, frágeis e dependentes, passam à crescidos, nutridos e independentes,  encarando hoje,  em suas vidas, desafios que outrora a protagonista era eu.


Zizi , 27/08/2016

As avós, essas mães com mel...


O tempo transforma experiências em sabedoria. Sempre me encantei com o conhecimento das pessoas mais velhas. Adoro aprender com elas! Como falam com propriedade dos assuntos! E o mais fascinante: tudo flui com uma simplicidade que desmascara o enigmático e a temida complexidade dos fatos cotidianos divulgados por aqueles que ainda não chegaram a esse nível de aperfeiçoamento humano.

Na adolescência, ficava imaginando como eu seria num futuro como mãe e mais tarde como avó. Estaria preparada? Pura bobagem! Não existe um momento específico para tal preparo. Somos aquilo que praticamos todos os dias, somos o que pensamos, o que desejamos, o que falamos, o que fazemos e, sobretudo, o que aprendemos com nossos mestres: os pais. Uma soma de itens variados que traz um resultado “x” e faz de nós únicos.

Reconheço que as maiores e melhores emoções são vividas nos momentos que não foram planejados passo a passo... Simplesmente as coisas acontecem, vinculadas, muitas vezes, ao elemento surpresa, como: dormi mãe e acordei avó! E agora? Como evitar a expressão interrogativa e o olhar preocupado por estar diante de um novo quadro, novíssimo, desconhecido até então por mim?

Mas o coração está no controle: não custa nada uma recepçãozinha com um tapete vermelho estendido para acolher a nova vida que já está a caminho e recebê-lo de braços abertos com uma  sequência infinita de abraços, beijos, afagos... Afinal vale muito a pena essa nova chegada!!

Minha mente retoma a figura da minha avó Maria: uma senhora tão dócil, tão meiga que conhecia a palavra AMOR em toda a sua dimensão e o distribuía, cuidadosamente,  entre os netos sem economizar carinho, atenção,  acalanto nos momentos em que os recebiam em sua casa.  

Trazendo um passado mais recente, esbarro em outra figura feminina a qual eu me espelho todos os dias porque ela representa o meu modelo ideal e perfeito de mulher-mãe-avó. Ela me ensinou tudo o que sei ou faço em nome dos meus netos. Minha mãe nos presenteava sempre com um sorriso doce recheado de carinho, com sabor infinito de satisfação por estar rodeada de netos.  Ela sim era o nosso maior e melhor presente e nem desconfiava! Aquele colo abrigava todos os netos que depois dos cafunés, corriam para a cozinha porque sabiam que haveria bolinhos de chuva no lanche da tarde seguidos de outras iguarias. Nunca soube dizer não aos pedidos dos pequenos. Acompanhou o crescimento deles para vibrar junto nas vitórias e orientá-los quando precisassem. Sua maior felicidade: vê-los, abraçá-los, agradá-los e, depois,  ficar ao lado contemplando aquelas figurinhas que lhe passavam o pente nos cabelos e questionavam os novos fios brancos que surgiam a cada dia...

Do lado paterno, meus filhos foram igualmente privilegiados e com um diferencial a mais: eram os únicos netos e não precisavam dividir a atenção com os demais primos. Evitar que ficassem mimados? Missão impossível! Deve-se aproveitar, da melhor maneira, a companhia dos avós enquanto os têm.  Esse contato é essencial e não tem preço!

Com esses exemplos que tive, tão ricos em amor, carinho, dedicação, paciência, gentileza...etc.,  impossível assumir uma postura diferente diante dos pequenos frutos que coloriram e perfumaram a minha casa desde 2004.
Gabrielzinho trouxe luz
E mudou todo o cenário
Preparou novo contexto
E não ficou solitário:
Um milagre aconteceu
O Johnny  logo nasceu
Lindo, forte, necessário.

São infinitas as mudanças que ocorreram em minha vida depois que me tornei avó. Fortaleci-me,  renasci, encontrei novos motivos para sorrir e voltar a me sentir feliz,  percebi que Deus permite uma compensação para as perdas e a força provém dos filhos e netos: esses adoráveis agentes do milagre da vida.

O que é ser avó, afinal? É ser duplamente mãe coberta com mel, regada com paciência, pintada com as  cores harmoniosas da emoção; é ter o coração elástico que não se importa em ser ampliado e povoado por essas bênçãos que carregam um pedacinho de nós.


Zizi, 19/08/2016