Tema: Uma pirraça que marcou
Se fôssemos dividir a nossa vida em dois momentos proporcionais
às relevâncias dos fatos, sem dúvida seria antes e depois de ser mãe. Essas
duas experiências significativas resumem o trajeto linear representado pelas
fases de criança à adolescente e de adulta à mulher.
Desde bem cedo, aprendi que os triunfos não estavam associados
às chantagens emocionais e muito menos às birras ou pirraças. Ainda que não
concordasse, nunca atropelei uma determinação dos meus pais porque eu era
apenas uma gota em meio àquele poço de sabedoria e de amor. Tinha muito que aprender antes de tornar-me
sujeito das minhas decisões.
A princípio, como filhas, vivemos sob condições impostas, um
espécie de liberdade guiada pela sabedoria dos pais, para o nosso próprio
bem, quer concordemos ou não (Só
descobrimos isso anos mais tarde)
Depois que os papéis se invertem, sentimos o irrecusável peso da
responsabilidade tocar-nos as costas e, de mansinho, estabelecer-se definitivamente
em nosso ser. O relógio inicia, então, a
contagem do tempo: é hora de colocar em prática os ensinamentos que tivemos
para melhor guiar, orientar, educar nossos filhos.
Ninguém nasce mãe, é um processo que ocorre junto com a gestação
e vai amadurecendo no dia-a-dia. A vontade de aprender e fazer tudo da melhor
forma possível supera a habilidade para tal. Por isso, impossível evitar
algumas gafes quando se deseja encarar, de fato, a maternidade.
Flechada pelo Cupido, aos 20 anos assumi o matrimônio dando
início a outra etapa da vida que já dura 34 anos e que floresceu
com a chegada dos filhos e depois,
dos netos.
Com a chegada dos dois rebentos, meus dias estavam plenamente
preenchidos, dois olhos mal conseguiam acompanhar o ritmo das peripécias de ambos. Danilo, movido
pela curiosidade, carrega consigo a medalha de ouro da teimosia. Patrícia, que
nunca gostou de papel subordinado, merece o troféu da argumentação.
Danilo escutava todos os conselhos, mas só seguia aqueles que
iam ao encontro dos seus objetivos, ou seja, nenhum! Foi assim que quase se perdeu
numa multidão; queimou a mão em uma
fogueira de S João; conheceu a sensação desagradável de um choque elétrico ao
mexer numa tomada, sentiu nas mãos o calor de um ferro elétrico ligado, tomou
várias ferroadas de abelhas, ficou preso dentro do capô de um veículo portando a chave, etc. Todos esses inevitáveis incidentes na
infância e parte da adolescência foram consequências de sua clássica
desobediência. Como adulto, menos
inconsequente e mais cauteloso, surpreendeu pela dedicação e senso de
responsabilidade ao lidar com suas obrigações e escolhas. Porém, a teimosia
ainda mostra suas garras, preferindo, muitas vezes, aprender com os próprios
tombos.
Patrícia, com poucos meses de vida, descobriu uma forma infalível
de persuasão que a acompanhou durante alguns anos e quase nos enlouqueceu: ela não podia
ser contrariada de forma alguma que perdia o ar e passava mal. Tinha que ser
socorrida às pressas, jogada para cima, sacudida, soprada. Imagine o desespero
meu e de todos da família com medo que acontecesse o pior. Algumas pessoas
afirmavam que aquilo era encenação dela, ou seja, pura manha, e que eu deveria dar uma palmada para
assustá-la. Não concordei com essa ideia
e preferi seguir a minha intuição e os conselhos médicos: quando ela ameaçasse
perder o ar, eu deveria sair de perto e observar de longe, sem que ela me
visse. Dessa forma, caso precisasse eu poderia socorrê-la. Quando percebeu que aquela
cena repetitiva já não provocava tanta atenção, aos poucos, ela parou. Até hoje
eu não sei explicar com exatidão o que acontecia com a minha pequena ou qual a
natureza daqueles dramas... Talvez aquela reação estivesse relacionada ao forte
temperamento dela que se manifestou de formas diversas e marcantes em outras
tantas cenas da vida...
Dois filhos, dois mundos que eu amo igualmente de forma
incondicional e me delicio ao rever suas histórias de traquinagens, confusões,
ações e reações que, aos meus
olhos, virou uma canção cujas notas
perpetuam docemente dentro deste coração materno que pulsa por eles...
Zizi Cassemiro, 08/06/2016
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