sábado, 11 de junho de 2016

Pirraça e suas marcas


Tema: Uma pirraça que marcou

Se fôssemos dividir a nossa vida em dois momentos proporcionais às relevâncias dos fatos, sem dúvida seria antes e depois de ser mãe. Essas duas experiências significativas resumem o trajeto linear representado pelas fases de criança à adolescente e de adulta à mulher.

Desde bem cedo, aprendi que os triunfos não estavam associados às chantagens emocionais e muito menos às birras ou pirraças. Ainda que não concordasse, nunca atropelei uma determinação dos meus pais porque eu era apenas uma gota em meio àquele poço de sabedoria e de amor.  Tinha muito que aprender antes de tornar-me sujeito das minhas decisões.

A princípio, como filhas, vivemos sob condições impostas, um espécie de liberdade guiada pela sabedoria dos pais, para o nosso próprio bem,  quer concordemos ou não (Só descobrimos isso anos mais tarde)

Depois que os papéis se invertem, sentimos o irrecusável peso da responsabilidade tocar-nos as costas e, de mansinho, estabelecer-se definitivamente em nosso ser.  O relógio inicia, então, a contagem do tempo: é hora de colocar em prática os ensinamentos que tivemos para melhor guiar, orientar, educar nossos filhos.

Ninguém nasce mãe, é um processo que ocorre junto com a gestação e vai amadurecendo no dia-a-dia. A vontade de aprender e fazer tudo da melhor forma possível supera a habilidade para tal. Por isso, impossível evitar algumas gafes quando se deseja encarar, de fato,  a maternidade.

Flechada pelo Cupido, aos 20 anos assumi o matrimônio dando início a outra etapa da vida que já dura 34 anos e que  floresceu  com a chegada dos filhos e depois,  dos netos.

Com a chegada dos dois rebentos, meus dias estavam plenamente preenchidos, dois olhos mal conseguiam  acompanhar  o ritmo das peripécias de ambos. Danilo, movido pela curiosidade, carrega consigo a medalha de ouro da teimosia. Patrícia, que nunca gostou de papel subordinado, merece o troféu da argumentação.

Danilo escutava todos os conselhos, mas só seguia aqueles que iam ao encontro dos seus objetivos, ou seja, nenhum! Foi assim que quase se perdeu numa multidão;  queimou a mão em uma fogueira de S João; conheceu a sensação desagradável de um choque elétrico ao mexer numa tomada, sentiu nas mãos o calor de um ferro elétrico ligado, tomou várias ferroadas de abelhas, ficou preso dentro do capô de um  veículo portando a chave,  etc. Todos esses inevitáveis incidentes na infância e parte da adolescência foram consequências de sua clássica desobediência. Como adulto,  menos inconsequente e mais cauteloso, surpreendeu pela dedicação e senso de responsabilidade ao lidar com suas obrigações e escolhas. Porém, a teimosia ainda mostra suas garras, preferindo, muitas vezes, aprender com os próprios tombos.

Patrícia, com poucos meses de vida, descobriu uma forma infalível de persuasão que a acompanhou durante alguns  anos e quase nos enlouqueceu: ela não podia ser contrariada de forma alguma que perdia o ar e passava mal. Tinha que ser socorrida às pressas, jogada para cima, sacudida, soprada. Imagine o desespero meu e de todos da família com medo que acontecesse o pior. Algumas pessoas afirmavam que aquilo era encenação dela, ou seja, pura manha,  e que eu deveria dar uma palmada para assustá-la. Não concordei com essa  ideia e preferi seguir a minha intuição e os conselhos médicos: quando ela ameaçasse perder o ar, eu deveria sair de perto e observar de longe, sem que ela me visse. Dessa forma, caso precisasse eu poderia socorrê-la. Quando percebeu que aquela cena repetitiva já não provocava tanta atenção, aos poucos, ela parou. Até hoje eu não sei explicar com exatidão o que acontecia com a minha pequena ou qual a natureza daqueles dramas... Talvez aquela reação estivesse relacionada ao forte temperamento dela que se manifestou de formas diversas e marcantes em outras tantas cenas da vida...

Dois filhos, dois mundos que eu amo igualmente de forma incondicional e me delicio ao rever suas histórias de traquinagens, confusões, ações e reações que,  aos meus olhos,  virou uma canção cujas notas perpetuam docemente dentro deste coração materno que pulsa por eles...


Zizi Cassemiro, 08/06/2016

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