quinta-feira, 24 de março de 2016

EMINENTES MICOS MATERNOS

Texto publicado no blog 
http://materna-idade.blogspot.com.br/2016/03/eminentes-micos-maternos.html  dia 21/03/2016


Tudo começa com um “sim”. E dessa junção de seres, outros contextos se formam recheados de novos integrantes com suas peculiaridades. Nem fazemos ideia do que nos aguarda...  Se estamos ou não preparados para os imprevistos decorrentes das aventuras maternas, como saber sem experimentá-las? Então, aceitamos o desafio.

Para quem já caiu da ponte em um rio enquanto pedalava uma bicicleta; despencou de uma árvore ao tentar saborear uma fruta amadurecida no pé; não conseguiu galopar e caiu do cavalo; ficou presa na porta do ônibus porque o motorista a fechou com antecedência; tomou um banho de lama ao cair da moto com o namorado; saiu apressada para o trabalho e nem reparou que a roupa estava do lado avesso;  percebeu que fora roubada no ônibus no momento de pagar a passagem; foi passar a roupa para a futura sogra e queimou algumas peças; virou piada na família depois do infeliz comentário que fez ao ver, pela primeira vez,  um pé de jabuticaba: ”Nossa, jabuticaba dá no pau”!!...etc...etc...etc  Não seria tão difícil encarar mais emoções envolvendo novas criaturinhas que, a seu tempo,  certamente chegariam.

Depois da troca de alianças no altar e as comemorações posteriores, passei de menina à mulher e fui fazer jus às promessas proferidas naquele 31 de julho de 1982. Em poucos anos, as palavras “crescei-vos e multiplicai-vos” ganharam significado em casa na forma duas bênçãos: Danilo e Patrícia.
Ele: inteligente, esperto, inquieto, curioso, traquina, andou aos nove meses e antes de completar um ano já falava feito uma matraca. Um projetinho ligado nos 220 v. que pôs um ponto final no meu sossego! Não podia tirar os olhos desta criatura tão dinamicamente minha. Devido ao seu gênio docemente indomável, alguns micos tornaram-se inevitáveis e ao mesmo tempo previsíveis; cabia a mim ou ao pai, arcar com as explicações.

Um deles ocorreu na igreja, durante a cerimônia da missa. Enquanto o padre discursava e os fiéis o ouviam, meu filho o observava, e de repente saiu em direção ao altar,  sem aviso prévio. Parando em frente ao vigário, abaixou-se e ergueu a batina deste. Provavelmente ficara intrigado com o uso daquela vestimenta típica e quis verificar o que havia por baixo dela. Desconcerto geral na cerimônia, não havia quem não risse. O que poderíamos fazer para reverter o vexame? Nada! Só desculpas balbuciadas e recolher o menino ao colo.

Dali a quase dois anos chega ela: a pequena notável demonstrando desde já suas peripécias e habilidades. Esta, além de elencar as mesmas qualidades do irmão formando um par perfeito (para a minha alegria), acrescentou uns detalhes que me deixaram fora de órbita: não tinha trava na língua e colocou-me em saias justas diversas vezes. Dizia sempre o que pensava, doesse a quem doesse. Em alguns momentos, ela também expressava seus dotes artísticos: desenhava as pessoas e as presenteava. Tais  ilustrações eram ricas em detalhes naturais, ou seja, nuas. Faltavam-me as palavras para justificar sua originalidade.

Tão articulada era essa menina que, na escola, quando  escrevia textos, as professoras se recusavam a aceitá-los alegando que tinha sido feitos por mim, por conter ideias muito maduras para a idade dela. Como eu iria provar que a pequena era autossuficiente? Só eu sabia que sim.

Certa vez, na mesma igreja em que o Danilo erguera a batina do padre, estávamos lá novamente em uma cerimônia de Primeira Comunhão da Patrícia. O padre fez o seu discurso em homenagem aos participantes daquele ritual religioso e, dirigindo-se às crianças, perguntou se alguma delas gostaria que sua mãe, representando as demais,  viesse à frente e proferisse uma mensagem. Estavam presentes diversas crianças, porém, de onde eu estava, escutei uma vozinha familiar dizendo: “EU”. Perante uma igreja lotada, seria indelicado recusar um pedido desse. Trêmula e gelada pelo imprevisto, respirei fundo e fui, nem me lembro do que disse. Vítima da boa intenção e inocência de minha filha,  paguei o maior mico, pois sou tímida. 

Embora ficasse desestabilizada com as situações embaraçosas que meus rebentos  me preparavam, eu amava aquelas traquinagens e me divertia junto. Entretanto,  o tempo vai estendendo, apressadamente,  seu tapete cronológico sem pedir licença e insere aqueles pedacinhos da gente no mundo adulto. Se precisasse, eu faria tudo novamente. Valeu a pena cada mico!


Zizi,  21/03/2016

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