sábado, 8 de junho de 2013

A distância entre a teoria e a prática dos agrupamentos textuais

A evolução do homem foi possível graças à sua infinda necessidade de comunicar-se, pois não teria sentido algum desenvolver a linguagem em todos os seus aspectos se não houvesse um destinatário para compartilhar. A partir desse princípio de interação (verbal e/ou não verbal) foram surgindo aos poucos os gêneros textuais para, assim, atender a todas as demandas sociais.
Diferente da tipologia textual que possui certas limitações quanto às classificações, os gêneros textuais são dinâmicos e infinitos; seu surgimento, suas prováveis modificações e até seu desaparecimento são determinados pelo momento. Qualquer forma de expressão, é, portanto, uma prática social que brotou em um tempo específico,  sob um determinado contexto,  a partir de referido objetivo,  com certas propriedades que o diferenciam das demais produções.
Durante um bom tempo,  os gêneros textuais não eram pauta para pesquisas mais  aprofundadas no campo da linguística visto que o foco da aprendizagem era voltado à gramática normativa e algumas produções de textos já pré-estabelecidas no âmbito escolar. Só a partir dos anos oitenta em diante, houve um significativo progresso nos estudos voltados à prática da linguagem priorizando, desse modo, a diversidade textual produzida nas diversas manifestações socioculturais.
A  escola ainda representa o espaço ideal para construir conhecimentos gerais ou específicos e  por essa questão muitas alterações no ensino de Língua Portuguesa ocorrem nos currículos escolares com o   intuito  de trabalhar os gêneros textuais da melhor forma possível. 
Sobre esse aspecto destacam-se, entre outros, os estudos dos autores genebrinos:  Joaquim Dolz e Bernard Schneuwly que, preocupados com a aplicação mais adequada desse conteúdo no cotidiano escolar, criaram , em 1996, uma proposta didática de agrupamento de gêneros com progressão curricular, ou seja,  trabalhar  os diversos gêneros  correspondentes aos  tipos textuais ( narrar, relatar, argumentar, expor, descrever) em todas as séries, aumentando a cada ano o grau de complexidade na sua abordagem. Os critérios empregados na elaboração desse material tinham o objetivo de atender, efetivamente,  às funções básicas de ensinar a expressão oral e escrita contemplando a diversidade de gêneros nos diferentes ciclos do Ensino Fundamental , através uma estrutura mais organizada e pertinente para a construção de saberes. Segundo eles,  "trata-se de construir, com os
alunos, em todos os graus de escolaridade, instrumentos, visando ao desenvolvimento das capacidades necessárias para dominar os gêneros agrupados".
Comparando a Proposta Curricular do Estado de São Paulo com a tabela de agrupamento de gêneros proposta por Dolz e Schnewwly, percebe-se que, teoricamente, ambas tem pontos em comum no que se refere à definição, classificação, agrupamento e valorização dos gêneros textuais  que devem constar do currículo escolar.
Entretanto, na prática há divergências no currículo paulista quanto à aplicação dos conteúdos porque nele fica restrito a cada série um determinado conjunto de gêneros pertencentes  a uma mesma tipologia o qual  obedece a  seguinte ordem: narração na 5ª série, relato na 6ª série, descrição/pescrição na 7ª e argumentação na 8ª série, desviando  assim da sugestão dos  genebrinos.
Essa separação e divisão por série do objeto de estudo traz desvantagens ao educando porque  impede que ele desenvolva habilidades e competências em um maior número de gêneros e compreenda melhor o seu papel social. Mesmo no último ano do Ciclo Fundamental II (8ª série) não há espaço nem para uma revisão dos demais gêneros estudados nos anos anteriores. Desse modo, o aluno fica limitado a explorar somente a argumentação durante o ano letivo, como se as demais práticas ligadas à linguagem deixassem de acontecer em seu dia a dia, o que não é verdade. 
Essa “distância” das outras manifestações textuais com as quais o ser humano convive diariamente, contribui  de forma negativa para um possível esquecimento do assunto,  e isso implica despreparo, desconhecimento e, consequentemente, descontextualização da sua própria realidade social.
Como fica, então, o papel escolar que ocupa tantos anos na vida de uma pessoa e não utiliza esse período para prepará-la de forma eficaz quanto  à leitura de mundo e as práticas linguísticas que compõem o seu cenário social ? Um detalhe que deveria ser alterado já que a escola representa, na maioria dos casos, a única possibilidade de inserção nesse heterogêneo universo povoado pelas letras.



Referências bibliográficas:

DOLZ, J.; SCHNEUWLY, B. Gêneros e progressão em expressão oral e escrita - elementos para reflexões sobre uma experiência suíça (francófona). In: ROJO, R. H. R.;  CORDEIRO, G. S. (Orgs./Trads.) Gêneros orais e escritos na escola. Campinas: Mercado de Letras, 2004[1996], p. 41-70.


SECRETARIA DA EDUCAÇÃO, Proposta Curricular do Estado de São Paulo – Língua Portuguesa – Ensino Fundamental – Ciclo II e Ensino Médio. São Paulo: SEE – SP, 2008.

Agrupamento de gêneros (AVA)
Disponível em:
Acesso em 01/04/2012

DOLZ, Joaquim e SCHNEUWLY, Bernard Bernard Schneuwly
Os gêneros escolares -  Das práticas de linguagem aos objetos de ensino
Acesso em 01/04/2012


Diversidade Textual -  Os gêneros na sala de aula

Acesso em 01/04/2012

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