domingo, 25 de dezembro de 2011

Tema: Cartinhas para o papai Noel


Cartas (nem sempre) escritas
Famílias com crianças numa mesma expectativa aguardavam ansiosas um helicóptero que dali a instantes pousava  e surgia, então,  a ilustre figura:  um velhinho barbudo vestido de vermelho que trazia, à tiracolo , um saco, da mesma cor da roupa, recheado de brinquedos. A alegria era geral e ele distribuía os presentes.   A empresa onde meu pai trabalhava promovia esse evento no final do ano. Foi essa a imagem positiva que eu guardei do Papai Noel quando criança (Aos cinco anos). Depois dessa época, meu pai se machucou e ficou afastado do trabalho durante muito tempo e  se viu obrigado a adotar meios alternativos para manter a família que já contava com cinco pessoas. Cartinhas ao papai Noel não foram escritas; lógico, eu ainda não sabia ler!
Nos anos seguintes foi ficando  cada vez mais difícil viver essa fantasia, principalmente depois da mudança para o Nordeste (por quatro anos);  lá eu conheci, ao pé da letra, o verdadeiro sentido de uma vida complicada e sem recursos. O drama da seca nos atingiu também e tínhamos que sobreviver apenas com o mísero salário que meu pai recebia do INSS. Mesmo assim,  continuávamos morando na cidade, pois meus pais sempre fizeram questão de manter o nosso estudo.  Bem, quanto ao  Papai Noel, acho ele perdera o meu endereço.  E se eu fosse escrever a ele pedindo presentes, seria um egoísmo da minha parte, pois com tanta miséria, falta de água e fome por toda parte, os brinquedos deixaram de ser a prioridade...
No entanto, algo perto de casa me intrigava: havia um senhor meio gordinho, de barba e Cabelos brancos que vivia rodeado de crianças na calçada de sua casa. Eu o observava de longe (Desconfiada, passava sempre pela outra calçada)  e via que ele oferecia doces e, talvez,  brinquedos àquelas crianças que estavam à sua volta. Seria o papai Noel ?  Um dia, contei o fato à minha mãe e  o mostrei  porque tinha interesse em ir lá, quem sabe ganhar algum presente,  e não iria fazer isso sem sua autorização.  Movida pela natural sabedoria materna e um olhar clínico invejável, ela não me disse, diretamente, que havia pessoas, de caráter pecaminoso,  com intenções cruéis que se escondiam por trás de atitudes “supostamente bondosas” para abusar de crianças. Ao invés disso, ficou uma fera, gritou que ele era um SEM-VERGONHA  e proibiu-me até de passar naquela rua. Obedeci, sem compreender o porquê de tanto drama.  Afinal, para que questionar uma orientação materna?  Filho não tem que entender e sim obedecer;  o amadurecimento floresce com o tempo. Há experiências que não valem  a pena serem vivenciadas.  Definitivamente, aquele senhor não seria mesmo uma boa referência ao conhecido   papai Noel cantado em verso  e prosa,  tão ilustrado em nossa imaginação. Melhor não me arriscar a escrever cartinhas de natal, eu não tinha mesmo para quem enviar, além disso, elas poderiam cair em mãos erradas e imundas.
Doze anos depois, passei pela incomparável experiência de ser mãe e, entre outras preocupações normais dessa nova fase,  destaco uma  pertinente com o tema:  “ manter ou não a fantasia sobre o papai Noel para os filhos?” Optamos pelo  SIM, pois o contexto favorecia: a situação financeira não era tão ruim, meus filhos eram os primeiros netos dos avós paternos que os mimavam e  paparicavam ao pé da letra. Decorações não faltavam: árvores de natal com presépios, músicas natalinas, meias  penduradas nas janelas.  Danilo e Patrícia, orientados pelo corujão papai, enchiam as meias de capim para que as renas as comessem quando passassem por lá à noite e enquanto isso, o Bom Velhinho desceria com os presentes e também encheria as meias com doces variados. Era uma festa para ambos. Todos os anos as reivindicações deles eram atendidas mesmo sem as famosas cartinhas.
 Esse detalhe  despertou, principalmente no Danilo, uma  curiosidade extra em descobrir quem era essa misteriosa figura que adentrava sorrateiramente no quarto e deixava lá brinquedos e doces esperados. Arquitetou, então  um “plano infalível” : uma armadilha que o ajudasse a descobrir a verdadeira identidade do enigmático papai Noel . Deixaria algo em cima da porta entreaberta  e quando ele entrasse, o barulho  causado pela queda do objeto os acordaria e tudo seria, finalmente,  esclarecido.  A pequena,  no entanto, não concordava com a “ideia  brilhante” do irmão,  pois temia que o susto causado  afastasse o papai Noel  e ele fosse embora rapidinho sem deixar as encomendas.  O curioso insistia, a espertinha boicotava e acabou em nada esse grandioso projeto.
Papai Noel permaneceu no confortável anonimato, esperando, quem sabe, a chegada de uma provável cartinha que nunca fora escrita por essas duas gerações...
 Mas o Gabriel  veio para dar  um basta nessa “greve epistolar”. Neste ano, ele escreveu uma  cartinha muito carinhosa afirmando, mais de uma vez,  que acreditava e gostava do  papai Noel,  sem, no entanto, fazer  nenhum pedido de prendas. Eu o questionei e ele me respondeu que já possuía muita coisa e queria apenas falar para o papai Noel. 
Quem sou eu para destruir esse mundo de fantasia que tanto cativa a maioria das crianças, inclusive o meu neto? Mantivemos SIM o mesmo ritual das decorações natalinas, de  encher as meias dele de doces, biscoitos, balas à noite e o brinquedo aos pés da cama,  sem esquecer, sobretudo,  de  falar sobre o amor e o nascimento do filho de Deus .  Sei que com o tempo, aos olhos dos pequenos,  essa figura alegórica de papai Noel vai tomando outra forma até chegar à verdadeira imagem do pai e isso não causa tanto estranhamento. É como uma máscara usada durante um bailar, que a cada troca de melodia vai se desgastando com o uso até não ser mais necessária. Vale a pena esperar!
 Zizi, 24/12/2011

Nenhum comentário: