I
A nossa literatura,
com orgulho, apresenta
uma de suas autoras
com a visão mais atenta
aos problemas sociais
e os descasos gerais
que o preconceito ostenta.
II
Sua vida foi marcada
por esforços , sofrimentos,
humilhações, injustiças,
perdas, desentendimentos,
mudanças de residência,
ascensão e decadência,
e seus relacionamentos.
III
Nascida em Sacramento
que fica em Minas Gerais,
filha de analfabetos,
cresceu em áreas rurais,
sua infância foi sofrida,
por ser negra e desprovida
de posses materiais.
IV
Acusada de ser bruxa
pelo muito que sabia,
pois estudou só dois anos,
bem menos que pretendia,
Aprendeu o necessário,
leitura e vocabulário
viraram prosa e a poesia.
V
Quando veio a São Paulo
buscando a sobrevivência
morou no interior,
Adquiriu experiência,
Depois foi pra capital
pois era lá, afinal,
o centro das referências.
VI
Trabalhou como doméstica
com direito à cultura,
nas folgas, aproveitava
praticava a leitura.
Todo esse conhecimento
trouxe base e fundamento
à sua literatura.
VII
Sua condição humilde
a levou para a favela
Lá morou mais de 10 anos,
Viveu todas as mazelas,
Criou três filhos sozinha,
com os recursos que tinha,
frutos do trabalho dela.
VIII
Carolina de Jesus
fez das tripas, coração,
contra as adversidades:
pouco “SIM” e muito “ NÃO”,
nunca desistiu da luta ,
encarou toda a labuta
Sem perder a inspiração.
IX
Sem apoio ou escolha,
fez das ruas sua renda,
catava ferros, papéis
e os levava para venda
Dessa forma, garantia
o alimento aquele dia
E o lixo tornou-se a prenda.
X
Nos cadernos recolhidos
Carolina aproveitou
transformou-os em diários
registrando o que a marcou.
Com toda a propriedade
expôs a dura verdade
e tudo que pode, contou.
XI
Grandiosa mulher negra
poetisa e escritora
retratou fome e miséria,
não como espectadora,
Sem adorno ou fantasia,
relatou o dia a dia
da vida de catadora
Quem lê “Quarto de Despejo”
enxerga, com precisão,
o quanto a fome devora,
aquela população
que é marginalizada
e totalmente ignorada
pelo sistema vilão.
XIII
Seus escritos explodiram
foi sucesso garantido
dentro e fora do país
o seu grito foi ouvido
Aquela oportunidade
a tornou celebridade,
Seu sonho foi atendido.
XIV
A mesma sociedade
que sempre a rejeitou
quis compartilhar o brilho
e ao lado dela ficou
para fotos, entrevistas,
nos eventos elitistas,
que a fama lhe reservou.
XV
Porém, todo esse glamour
efêmero e pontual
tem prazo de validade
bem menor que o ideal:
O tudo virou em nada,
sua voz silenciada
de forma tão desleal.
XVI
A miséria e a fortuna
conviveram atreladas
como faca de dois gumes
drasticamente afiadas
machucaram as raízes
restaram as cicatrizes
para que sejam lembradas.
XVII
Mais uma vez a mulher
mostra uma superação
emergindo em campo infértil
semeia sua oração:
duela com o preconceito
luta pelo seu direito
e prova que tem razão.
XVIII
Carolina de Jesus
autora e personagem
símbolo de resistência
Um ícone de coragem,
autêntica , realista,
consciente, feminista,
A você, minha homenagem!
Zizi, 26/06/2021